Taxa sobre compras pode encarecer remédio importado

Área: Fiscal Publicado em 04/07/2024

Taxa sobre compras pode encarecer remédio importado

A cobrança de pelo menos 20% de Imposto de Importação sobre compras internacionais, aprovada pelo Congresso e que aguarda a sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), mirou a concorrência de “blusinhas”, produtos eletrônicos e brinquedos asiáticos vendidos pelo e-commerce, mas pode tornar mais caros também os medicamentos importados por pessoas físicas em tratamento no Brasil que hoje são isentos do tributo.

O fim ou não dessa isenção é alvo de divergências jurídicas. Relator do projeto, o deputado Átila Lira (PP-PI) diz que a intenção não é acabar com o benefício para medicamentos. Ele apresentou ao Valor um posicionamento técnico da consultoria da Câmara dos Deputados que sustenta a manutenção da isenção. “Jamais seria nossa intenção acabar com esse benefício”, afirma o parlamentar.

Advogados, entidades ligadas a doenças raras e o setor farmacêutico, contudo, afirmam que o projeto estabeleceu um piso mínimo para esse imposto, o que impedirá o Ministério da Fazenda de manter a medida. A decisão deve ser da Receita Federal - que, procurada pelo Valor, não se manifestou até a publicação deste texto.

Desde 1999, uma portaria do Ministério da Fazenda garante a isenção de Imposto de Importação para medicamentos de até US$ 10 mil comprados por pessoas físicas. Os produtos não podem ser proibidos no Brasil e devem atender as regras da Receita Federal e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para importação.

O Congresso aprovou o fim da isenção de imposto de importação para produtos de até US$ 50, para ajudar a indústria e varejo nacionais. A extinção do benefício entrou como um “jabuti” no projeto que cria a nova política automotiva do país, o Mover. A partir da sanção, os bens adquiridos no e-commerce internacional de até US$ 50 serão taxados em 20% e os de valor entre US$ 50 e US$ 3 mil continuarão a pagar 60%. Além disso, incide 17% de ICMS, cobrado pelos Estados.

Ocorre que essa taxação também pode revogar a isenção para os medicamentos importados. “Isso é uma catástrofe, especialmente para as pessoas com doenças raras, que dependem de alguns medicamentos importados”, diz Antoine Daher, criador e presidente da Casa Hunter, instituição voltada a ajudar pessoas com doenças raras. “Vai, infelizmente, restringir esse acesso a muitas terapias que esses pacientes precisam”, afirma.

O advogado Alan Viana, do MJ Alves Burle e Viana  Advogados, afirma que o projeto aprovado estabelece uma taxação mínima de 20% das importações e, com isso, veda a isenção. “A alíquota zero aplicável aos medicamentos por força da portaria pode ser impactada pelo projeto de lei, pois o texto aprovado prevê uma alíquota mínima para as postagens, independentemente da classificação estabelecida pelo Ministro  da  Fazenda”, diz.

Ex-procurador-geral da Fazenda Nacional, o advogado Ricardo Soriano, sócio do Figueiredo e Velloso Advogados, também entende que o projeto de lei afetará a portaria, que precisará ser refeita para se adaptar à criação de um limite mínimo para o imposto. “O Ministério da Fazenda continuará com o poder de fixar, via portaria, a taxação genérica e as alíquotas especiais. Mas terá que fixá-las de acordo com a nova redação, com as limitações  impostas”,  diz.

O advogado Eduardo Natal, do escritório Natal & Manssur, concorda com a interpretação de Átila Lira, relator do projeto, e diz que a norma específica continuaria em vigor. “O projeto altera o decreto-lei 1804, mas mantém a delegação para que o Ministério da Fazenda possa definir, em atos infralegais, sobre alíquotas especificas para determinados bens.”

Procurado, o Ministério da Fazenda não comentou. (Colaborou Jéssica Sant’Ana)

Fonte: Valor Econômico