STF vai definir limites entre fraude e legalidade da pejotização

Área: Contábil Publicado em 30/04/2025

A suspensão de todas as ações trabalhistas que discutem a legalidade da contratação de autônomos e prestadores de serviços como pessoas jurídicas, a chamada pejotização, determinada recentemente pelo ministro Gilmar Mendes, do STF (Supremo Tribunal Federal), traz mais segurança jurídica para as empresas, na avaliação de advogados trabalhistas.

Na decisão de mérito da matéria, reconhecida como de repercussão geral e ainda sem data definida para ser analisada pelos ministros, espera-se uma uniformização do entendimento a respeito desse modelo de contratação, impulsionado pela reforma trabalhista, evitando decisões contraditórias e acúmulo de ações na Justiça do Trabalho.

Diário do Comércio ouviu especialistas para analisar os impactos e os vários aspectos da decisão, que deve definir o futuro da pejotização.

Revisão de Contratos

Para Marcel Zangiácomo, sócio do Galvão Villani, Navarro, Zangiácomo e Bardella Advogados, é fundamental que as empresas revejam seus contratos e práticas de forma a garantir que não haja subordinação, pessoalidade ou habitualidade disfarçadas.

Segundo ele, o que está em jogo com a decisão é encontrar o equilíbrio entre flexibilidade das relações de trabalho e proteção contra fraudes.

“O STF tem se posicionado de forma mais pragmática quanto à livre iniciativa e à liberdade contratual. O julgamento de mérito definirá os limites objetivos entre fraude e legalidade na terceirização e na contratação de autônomos.”

Para Vanessa Carvalho, sócia no Miguel Neto Advogados, é de extrema importância a formalização de contratos de prestação de serviços bem elaborados, que estipulem de forma clara e objetiva direitos e obrigações das partes. “Sem isso, não há o que se falar em validade da contratação de prestadores de serviços.”

A advogada diz que a reforma trabalhista, em 2017, privilegiou o acordado entre as partes e os contratos de prestação de serviços devem reproduzir a vontade dos dois lados. “A Justiça do Trabalho vem enfrentando o tema observando, principalmente, eventuais cláusulas abusivas.”

Na prática, dentre outros aspectos, o prestador não pode, por exemplo, estar submetido a jornada de trabalho pré-determinada ou fixa, tampouco receber sanções disciplinares, como suspensões e advertências.

STF versus TST

De acordo com Bruno Okajima, sócio do escritório Autuori Burmann Sociedade de Advogados, historicamente, a Justiça do Trabalho adota uma postura mais protetiva, analisando a realidade da prestação de serviços. Isso significa que, se houver subordinação, pessoalidade, habitualidade e onerosidade – requisitos para a caracterização da relação de emprego -, ainda que o contrato seja de PJ, o vínculo de emprego pode ser reconhecido.  

Já o STF, segundo Okajima, tem deixado claro que contratar pessoas jurídicas não é ilegal por si só, pois é preciso respeitar o direito das partes de firmarem contratos com base na livre escolha e autonomia.

“É preciso lembrar que a Reforma Trabalhista de 2017 não proibiu a contratação de PJs, mas reforçou a possibilidade de outras formas de contratação além do vínculo de emprego.”

O advogado diz que o embate continua justamente porque a Justiça do Trabalho nem sempre reconhece a contratação como válida, especialmente quando os elementos do vínculo estão presentes.

“O que está em discussão no STF, também, é se a Justiça do Trabalho pode, em qualquer hipótese, desconstituir contratos civis ou comerciais com base na ‘realidade contratual’. E também quem deve provar que houve, ou não, fraude: o trabalhador, a empresa ou ambos. Esse debate é relevante porque pode mudar o entendimento atual sobre os limites da atuação da Justiça do Trabalho e dar maior previsibilidade jurídica às empresas.”

Para Okajima, a decisão do STF de suspender nacionalmente todos os processos que discutem a licitude de contratos de prestação de serviços é extremamente relevante para as empresas que atuam com contratos civis legítimos.

“O reconhecimento da repercussão geral sinaliza que o Supremo pretende uniformizar o entendimento sobre a possibilidade de contratação de profissionais autônomos e empresas (as chamadas “pejotizações”) fora do regime celetista.”

Segundo o advogado, trata-se de uma medida que pode trazer maior segurança jurídica às empresas que atuam com contratos civis legítimos e que, por vezes, são surpreendidas por decisões da Justiça do Trabalho que presumem vínculo empregatício, mesmo diante da autonomia contratual.

Liberdade Econômica

Segundo Juliana Raffo, advogada especialista em direito empresarial do Briganti Advogados, especialmente depois da entrada em vigor da Lei da Liberdade Econômica, de 2020, o modelo de contratos “PJ” ganhou força e nem sempre é fruto de tentativa de burlar a lei trabalhista.

“Trata-se de um formato que atende melhor aos interesses das partes, inclusive dos reais prestadores de serviços que buscam separar sua responsabilidade da pessoa física, dos riscos da sua operação ou buscam melhor planejamento tributário da sua atividade.”

Segundo ela, no dia a dia da advocacia empresarial, mesmo diante de verdadeiros contratos “PJ”, os advogados são obrigados a avaliar riscos trabalhistas que o cliente pode ter, exatamente pela insegurança jurídica que decorre da falta de padronização do entendimento sobre o tema no Judiciário.

Limites da contratação

Para Ana Luiza Troccoli, advogada trabalhista, a terceirização e a contratação de prestadores de serviço como pessoas jurídicas trazem vantagens, desde que os contratos sejam verdadeiros, regulares e considerados legais.

“Para ser regular, o contrato precisa ser claro e bem redigido e o contratado tem que ter a sua autonomia mantida, ou seja, não pode estar sujeito à subordinação direta, controle de jornada ou ordens da contratante.”

Além disso, diz, a remuneração deve estar vinculada aos resultados e não ao tempo à disposição do empregador. “Em suma, contratar serviços por meio de PJ é legal. Contratar empregados como se fossem PJ não é.”

 

Fonte: Fonte: Diário do Comércio