Justiça derruba liminares que afastavam a cobrança de taxa sobre grãos exportados

Área: Fiscal Publicado em 25/04/2025

Justiça derruba liminares que afastavam a cobrança de taxa sobre grãos exportados

As liminares que afastavam a cobrança da nova taxa sobre grãos criada pelo Estado do Maranhão tiveram efeito por pouco tempo. Uma decisão suspendeu todas elas até o trânsito em julgado dos processos (quando não cabe mais recurso). A medida ainda foi estendida a todas as ações sobre o tema, que já foi parar no Supremo Tribunal Federal (STF).

A Associação Nacional dos Transportadores Ferroviários (ANTF) entrou com uma ação no Supremo para que a Lei Estadual nº 12.428/2024, que criou a Contribuição Especial de Grãos (CEG), seja invalidada (ADI 7802). Desde o mês de fevereiro, é cobrado o percentual de 1,8% sobre cada tonelada de soja, milho, milheto e sorgo que entram e circulam no Estado voltados à exportação.

O novo imposto é exigido de produtores e companhias do Estado no dia 20 de cada mês. Mas também é cobrado de empresas que não residem no Maranhão, na entrada dos caminhões e dos vagões ferroviários, que têm responsabilidade solidária no pagamento do tributo. Há um receio de bitributação, pois taxas semelhantes são recolhidas em outros Estados e não há previsão legal para o valor pago em outra unidade federativa ser abatido.

A estimativa é de um prejuízo que varia entre R$ 300 milhões e R$ 600 milhões por ano para as empresas, considerando o total exportado de soja do Terminal de Grãos do Maranhão (Tegram). Segundo a Associação dos Produtores de Soja e Milho do Estado do Maranhão (Aprosoja-MA), o prejuízo é de 12% a 15% aos produtores e um custo anual de R$ 269 milhões.

Advogados e entidades do agronegócio dizem que o setor já começa a estudar uma rota alternativa para escoar os grãos e evitar o Tegram. Os portos de Santos (SP) e Paranaguá (PR) são opções consideradas. Na petição ao STF, a ANFT diz que a exigência do novo tributo reduzirá a demanda do Porto de Itaqui (MA) em torno de 20% a 30%, além de comprometer a atratividade do Estado para novos investimentos.

Existem ao menos 15 ações sobre o assunto, segundo levantamento do Santo Neto Advogados. Em três delas, os contribuintes afastaram a cobrança - foi o caso da NovaAgri, Terrus S/A e Aprosoja-MA em ação coletiva (processo nº 0826962-97.2025.8.10.0001). Eles devem recorrer da recente decisão obtida pela Procuradoria Geral do Estado do Maranhão (PGE-MA).

Ela foi dada pelo presidente do TJMA, o desembargador José de Ribamar Froz Sobrinho, em uma ação de suspensão de liminar e de sentença. Sobrinho considerou que as liminares “inibem o Estado de exercer sua plena competência tributária, comprometendo com isso a arrecadação pública”. Para o magistrado, “representam grave risco de lesão à ordem e ao interesse público” (processo nº 0808422-04.2025.8.10.0000).

A lei maranhense se ancora em um “jabuti” da reforma tributária (Emenda Constitucional nº 132, de 2023), o artigo 136 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT). Ele prevê que Estados instituam contribuições sobre produtos primários ou semielaborados, desde que já houvesse imposto similar antes de 30 de abril de 2023.

As companhias defendem que o Maranhão não respeitou os requisitos do ADCT. “O Estado não se enquadra nessas condicionantes e não tem permissão constitucional para instituir essa taxa”, afirma o diretor jurídico e regulatório da ANTF, Yuri Pontual. Ele alerta para possível bitributação, pois há tributos semelhantes à CEG em outros Estados.

“Isso onera demasiadamente a carga e reduz a competitividade nacional”, diz. Além disso, como a lei prevê a responsabilidade solidária dos transportadores, a tendência, segundo Pontual, é que a CEG seja cobrada diretamente deles. “O Estado do Maranhão não tem poder fiscalizador sobre a carga advinda de outro Estado, então a tendência é que o fiscal cobre diretamente da ferrovia [transportador] para a ferrovia fazer a verificação de conformidade fiscal.”

Segundo a PGE-MA, houve prejuízo de R$ 484,6 milhões, entre 2018 e 2025, com a manutenção das rodovias estaduais que escoam soja, e a CEG ajudaria a manter essa infraestrutura. Em paralelo, afirma que o setor do agro obteve “lucros extraordinários” com exportação, “sem qualquer contribuição à sociedade no recolhimento de impostos, ante sua imunidade tributária constitucionalmente garantida de ICMS”.

O órgão também defende que a lei estadual cumpre os requisitos da EC nº 132. Diz ainda que a base de cálculo do ICMS é mais ampla que a da CEG, por isso, são distintas. Esta tem uma “base de cálculo única”, que é a tonelada do grão e o tributo estadual incide sobre a tonelada do grão, custos operacionais, frete, o próprio ICMS e outros encargos.

A ANFT argumenta, contudo, que a CEG tem natureza jurídica de adicional de ICMS e não se pode tributar a exportação, que tem imunidade, conforme prevê a Constituição Federal. Cita precedente do Tocantins que criou tributo similar sobre grãos, a Contribuição ao Fundo Estadual do Transporte (FET), declarada inconstitucional pelo Supremo (ADI 6365). A decisão foi antes da reforma tributária.

Além do STF, os contribuintes buscam fazer uma pressão política para que o Estado recue da medida ou, ao menos, abaixe a alíquota. Movimento semelhante ocorreu no Pará, que criou uma contribuição similar em dezembro do ano passado, mas após pressão do agronegócio, o governador Helder Barbalho (MDB) revogou a cobrança.

Para o tributarista Leandro Lopes Genaro, sócio do Santos Neto Advogados, a liminar do TJMA é uma interferência direta do Executivo no Judiciário. “É uma decisão política, não tem análise jurídica. São conceitos genéricos sobre possível lesão à ordem pública”, diz.

Henrique de Freitas Munia e Erbolato, do Santos Neto, afirma que a decisão dificulta o sucesso nas ações individuais. “A liminar acaba sendo uma trava, para fins econômicos, do efeito das decisões para os contribuintes, porque o Estado acaba ganhando tempo na discussão.”

Há preocupação com eventual modulação dos efeitos na ação do STF. Isso porque se os ministros restringirem a aplicação do julgamento para o futuro, os valores pagos de CEG ao longo dos anos não poderá ser devolvido. “Daqui a seis ou oito anos já não será o mesmo governador e o pagamento vai se estender em precatório. O importante para o Estado é o dinheiro agora”, diz Genaro.

Fonte: Valor Econômico