Notícia - Seguro de vida pode variar entre diretores e empregados

Área: Pessoal Publicado em 02/09/2025

Fonte: Jornal Valor Econômico 

Orientação da Receita Federal aos fiscais do país deverá evitar autos de infração para cobrar contribuição previdenciária sobre tais valores.

As empresas ganharam um estímulo da Receita Federal para oferecer seguro de vida - assistencial ou VGBL - aos funcionários. Recentemente, o órgão passou a entender que não há a necessidade de que o valor do prêmio e da indenização sejam iguais ou mesmo proporcionais à remuneração paga a empregados e dirigentes. Esse posicionamento, que orientará os fiscais do país, consta da Solução de Consulta nº 105, da Coordenação-Geral de Tributação (Cosit).

Essa orientação deverá evitar autos de infração para cobrar contribuição previdenciária sobre os valores de seguros. Isso acontecia porque era comum fiscais interpretarem a falta de “uniformidade” na concessão do benefício como pagamento de “salário disfarçado”.

Ao responder à consulta, a Receita declara que “a condição presente no artigo 4º, II, da Lei nº 11.053, de 2004, pela qual o seguro deve ser oferecido indistintamente aos empregados e dirigentes, objetivou condicionar a dedutibilidade da despesa à extensão do benefício à totalidade de empregados e dirigentes da pessoa jurídica. Portanto, a distinção a que a norma buscou coibir não está relacionada aos valores do capital segurado atribuídos a cada beneficiário”.

Por outro lado, o Fisco deixa expresso na solução de consulta que juros sobre capital próprio (JCP) e dividendos não entram no cálculo do quanto a empresa pode deduzir do Imposto de Renda (IR) por pagar voluntariamente o seguro de vida para os funcionários. O limite de dedução do IR é de 20% da remuneração pelo trabalho.

De acordo com o artigo 373, do Regulamento do Imposto de Renda (RIR), “são dedutíveis as contribuições não compulsórias destinadas a custear planos de benefícios complementares assemelhados aos da previdência social, instituídos em favor dos empregados e dirigentes da pessoa jurídica”.

“Ao interpretar o requisito de ‘oferta indistinta’ do benefício aos empregados e dirigentes, a Receita Federal esclarece que a exigência se refere à disponibilização ampla do benefício a todo o corpo funcional, e não à uniformidade dos valores segurados, permitindo variações entre os beneficiários”, diz Fernanda Ogata, do ALS Advogados.

Por isso, afirma a advogada, a solução de consulta da Cosit pode colaborar também para a uniformização de entendimentos no âmbito do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), “que já sinalizou em decisões anteriores pela necessidade de valores uniformes como condição para a dedutibilidade do IR”.

O Carf já se posicionou de forma desfavorável aos contribuintes em situações semelhantes, como em relação a benefícios previdenciários e planos de saúde. O motivo é haver distinção na oferta desses serviços assistenciais entre empregados e dirigentes. “Foi o que aconteceu em um acórdão que analisou autuação previdenciária contra empresa que oferecia planos de saúde com características diferentes para empregados e dirigentes”, diz.

No acórdão nº 9202-009.725, por exemplo, por maioria dos votos, os conselheiros da 2ª Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais (CSRF) decidiram que “os valores relativos a assistência médica integram o salário de contribuição, quando os planos e as coberturas não são igualitários para todos os segurados”.

No caso, uma fábrica de doces entrou com recurso contra autuação fiscal. Foram considerados fatos geradores os valores de custeio ou reembolso de plano de assistência médica diferenciado para os segurados que ocupam cargos de diretoria ou gerência, que não transitou pela folha de pagamento.

Já pelo acórdão nº 2201-004.973, também por maioria dos votos, o Carf manteve autuação contra banco que oferecia planos de previdência complementar distintos para empregados e diretores por “ausência de propósito previdenciário”. Na decisão, a 1ª Turma da 2ª Câmara da 2ª Seção declarou que os valores dos aportes “não integram a base cálculo da contribuição previdenciária, desde que não utilizados como instrumento de incentivo ao trabalho, concedidos a título de gratificação, bônus ou prêmio”.

Não se sabe se há julgamento do Judiciário a respeito, mas também há jurisprudência do Carf favorável aos contribuintes. Em 2021, por empate, a 2ª Turma da 4ª Câmara da 1ª Seção decidiu que “exigir que haja cobertura a todos os empregados e dirigentes da empresa é diferente de exigir que haja a mesma cobertura a todos estes funcionários”. “Não cabe ao intérprete estabelecer qualquer outro critério discriminativo”, declaram os conselheiros na decisão (processo nº 11065.002758/2005-67).

O advogado Fernando Colucci, do Machado Meyer Advogados, lembra que a Receita Federal já havia abordado o tema por meio da Solução de Consulta Cosit nº 168, de 2021. Nela, o Fisco fala que o benefício deve ser oferecido “indistintivamente” a todos, funcionários e dirigentes. “Mas a solução de consulta não entrou no detalhe da universalidade [para todos] versus uniformidade [mesmo valor], deixando uma brecha para interpretações”, afirma o tributarista.

Para Colucci, a SC 105 pacifica essa discussão. “A orientação dá uma tranquilidade maior às empresas, que podem oferecer benefícios previdenciários para diretores e empregados, fazendo diferença na cobertura a depender do cargo”, diz. “No mercado, hoje, a maioria já faz assim, oferecendo o benefício para todos, mas com coberturas diferenciadas, e sabemos de empresas autuadas pela Receita.”

Quanto à exclusão dos dividendos ou JCP do cálculo da dedutibilidade de custos com esses benefícios do IR, Colucci entende que o objetivo é evitar abusos. “Se não existisse esse teto, a empresa poderia pensar em pagar um valor menor de salário e um montante maior de previdência”, afirma. “Outros países como Estados Unidos, Reino Unido e Alemanha também têm regras para estabelecer travas nesse sentido.”