Notícia - Quando o psicossocial afeta o local de trabalho
Área: Pessoal Publicado em 01/04/2025Fonte: Jorna Valor Econômico
O investimento em uma gestão empresarial humanizada, hábil a trazer satisfação no trabalho, refletirá na diminuição de acidentes de trabalho, de ausências e da rotatividade de empregados
Com as recentes alterações legislativas no campo das normas regulamentares do Ministério do Trabalho e Emprego, operadores do direito, gestores e profissionais da saúde se viram instados a aprofundar as discussões acerca da necessidade de proteção da saúde do trabalhador no ambiente de trabalho.
A legislação brasileira já garante a todos os trabalhadores o direito a um meio ambiente de trabalho seguro e saudável, com foco na prevenção de acidentes típicos e doenças profissionais. Mas em razão da velocidade das revoluções tecnológicas e alterações no formato do trabalho e na própria interação social, verificou-se um agravamento da saúde mental dos trabalhadores.
A pandemia da covid-19 obrigou a sociedade a tratar do tema com maior urgência. Em setembro de 2022, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) e a Organização Mundial de Saúde (OMS) publicaram diretrizes sobre a saúde mental no trabalho, destacando a importância de ações para enfrentar rotinas desgastantes, como excesso de horas extras, ambientes insalubres, assédio moral e outros fatores que criam angústia no trabalho.
É inquestionável que o trabalho interfere na saúde mental, tanto positiva como negativamente, dependendo de como é desenvolvido. Ou seja, em todo ambiente de trabalho existem fatores psicossociais, que afetam a psique do trabalhador, e devem ser considerados, tais como: a interação entre as pessoas e com o ambiente, o conteúdo da atividade, o modelo de gestão e a cultura organizacional.
Da mesma forma, todo trabalhador traz consigo fatores que também devem ser avaliados: capacidade e formação profissional, acesso à alimentação, à segurança e ao atendimento básico de saúde, suas relações interpessoais e seu histórico familiar.
Seguindo esse raciocínio, a OIT recomenda que empregadores e agentes responsáveis pela gestão empresarial adotem medidas capazes de avaliar quais seriam os fatores de risco psicossociais do ambiente de trabalho. Em outras palavras, identificar, entre os fatores presentes no ambiente de trabalho, os que estariam em desequilíbrio e que poderiam trazer possíveis efeitos negativos à saúde do trabalhador.
Nesse contexto, a NR-01 do Ministério do Trabalho e Emprego foi atualizada para definir fator de risco ocupacional como sendo o “elemento ou situação que, isoladamente ou em combinação, tem o potencial de dar origem a lesões ou agravos à saúde”, em outras palavras, risco seria igual a perigo versus exposição.
Essa definição deixa claro que a saúde mental é tema complexo e as doenças mentais têm origem multifatorial. De toda sorte, seguindo as orientações da OIT, a NR-01 prevê obrigatoriedade dos empregadores adotarem, no Programa de Gerenciamento de Riscos Ocupacionais (PGR), medidas de avaliação, prevenção, monitoramento, controle e eliminação desses fatores de risco psicossociais.
É importante destacar que a identificação desses riscos no PGR contribuirá para o planejamento de ações de prevenção, monitoramento e até mesmo para a eliminação dos riscos psicossociais do trabalho. Por outro lado, a falta de adoção dessas medidas de controle pode agravar o estresse no ambiente de trabalho, desencadeando doenças mentais, com prejuízo a todos - empregados, empregadores e à sociedade em geral.
O estresse é parte integrante da vida de todos e tem como função impulsionar a criatividade, a vitalidade, a produtividade e as funções cognitivas, além de melhorar o humor. Todavia, quando não conseguimos lidar bem com ele, pode gerar sofrimento e doenças. O estresse pode ter origem em fatores externos ou internos, e, embora seja psicológico, também afeta a saúde física das pessoas.
Os fatores externos podem relacionar-se ao trabalho, por exemplo: sobrecarga de atividades, conflitos no ambiente de trabalho, bem como a existência de problemas familiares e financeiros. Já os fatores internos estariam mais relacionados às disposições pessoais do indivíduo ligados à sua personalidade.
A realidade socioeconômica do trabalhador brasileiro é fator que pode agravar o estresse, incluindo ausência de saneamento básico, a qualidade dos serviços de saúde e de educação, a segurança, além de estilo de vida individual como o hábito de fumar ou praticar exercícios físicos.
Sendo assim, na avaliação dos fatores de risco psicossociais no ambiente de trabalho, não significa que eventuais doenças que afetam a saúde mental do trabalhador terão necessariamente nexo de causalidade exclusiva com o trabalho. Na verdade, a avaliação da saúde mental do trabalhador deve necessariamente levar em consideração as condições multifatoriais de cada caso.
Isso porque a exposição de trabalhadores a fatores psicossociais no trabalho não constitui necessariamente um risco ocupacional, pois, a depender da eficácia das ações de prevenção e controle adotadas, haverá eliminação do perigo.
Constata-se que o atual ordenamento jurídico brasileiro, que engloba também as normas da OIT ratificadas pelo Brasil, acaba por incentivar, indiretamente, que as empresas invistam em melhores modelos de gestão empresarial. E o investimento em uma gestão empresarial humanizada, hábil a trazer satisfação no trabalho, refletirá na diminuição de acidentes de trabalho, de ausências e da rotatividade de empregados. Trará também reflexos positivos na produtividade dos trabalhadores e no crescimento saudável da organização.
A temática é relevante e merece ser enfrentada com seriedade, não apenas pelos profissionais da saúde e do direito, mas especialmente nos meios político e econômico, pois a saúde mental dos cidadãos é responsabilidade de todos.