Reforma Tributária e PLP 108: Holding Ressuscitou?

Área: Contábil Publicado em 17/09/2025

A reforma tributária quase matou as holdings. O novo PLP 108 recuou. Uma vitória? Sim, mas a guerra não acabou. Entenda a janela de oportunidade e os novos riscos.

Nos últimos meses, nos corredores dos escritórios de advocacia e nas salas de conselho das famílias empresárias, um clima de funeral se instalou. Uma das ferramentas mais eficazes e tradicionais de planejamento sucessório e patrimonial, a holding familiar, havia recebido uma sentença de morte.

A arma do crime? A primeira versão do texto regulatório (PLP 68, depois renumerado para PLP 108) da reforma tributária.

Aquele texto era um míssil teleguiado. Ele estabelecia duas regras que, na prática, tornavam a criação ou a sucessão de uma holding inviável:

ITCMD a valor de mercado: A transferência de cotas da holding (por doação ou herança) seria tributada pelo ITCMD com base no valor de mercado dos ativos dentro dela. Isso criaria um impeditivo gigantesco. Considerando que a maioria das famílias procuram esse tipo de solução para fins de economia (também).

Fim do "Turismo Fiscal": O imposto seria devido no local onde o imóvel estava fisicamente localizado, pondo um fim à estratégia de mudar o domicílio fiscal para um estado com ITCMD mais baixo para realizar a doação.

O primeiro ponto, sozinho, era uma catástrofe. Imagine uma holding familiar dona de um único imóvel, comprado há 30 anos por R$ 1 milhão (valor contábil), mas que hoje vale R$ 20 milhões no mercado. Pela regra antiga, a doação das cotas seria tributada sobre R$ 1 milhão (ou algo aproximado disso). Pelo texto original da reforma tributária, o imposto incidiria sobre os R$ 20 milhões. A conta se multiplicaria por 20. Era o fim do jogo.

Mas, em uma reviravolta que poucos esperavam, o executor parece ter repensado a penalidade. O novo texto da PLP 108, publicado recentemente, recuou de forma espetacular.

A holding ressuscitou?

A reviravolta: O que o novo texto diz...

O novo texto representa um recuo inteligente do legislador, que percebeu o potencial destrutivo da proposta original. A mudança mais crucial está na base de cálculo do ITCMD para as cotas de empresas não negociadas em bolsa, como as holdings familiares.

O texto agora diz que a base de cálculo será o "valor patrimonial correspondente ao patrimônio líquido".

Em bom português: o imposto voltará a incidir sobre o valor contábil da empresa, não sobre seu valor de mercado.

Voltando ao nosso exemplo: a transferência das cotas daquela holding com o imóvel de R$ 20 milhões voltará a ser tributada sobre o valor do patrimônio líquido, que reflete aproximadamente R$ 1 milhão original. A diferença não é apenas numérica; é a diferença entre um planejamento viável e a expropriação fiscal. Foi um suspiro de alívio coletivo para planejadores e famílias. Essa alteração na reforma tributária reabriu essa avenida (talvez uma das principais) para a organização sucessória no Brasil.

A guerra não acabou...

Seria um erro fatal, no entanto, interpretar essa vitória como o fim da guerra. Este foi apenas um recuo em uma das frentes de batalha da reforma tributária. O ambiente para o planejamento patrimonial ainda é, e continuará sendo, muito mais hostil do que antes.

A ressurreição da holding não a torna imune às outras ameaças que a reforma tributária e o atual contexto fiscal trazem:

Tributação de dividendos: Hoje, os lucros distribuídos pela holding aos sócios são isentos de Imposto de Renda. Esta isenção pode estar com os dias contados. A tributação de dividendos é uma pauta constante e, quando vier, mudará drasticamente o cálculo da eficiência de se ter uma holding para gerir o patrimônio e distribuir renda.

O fim do JCP - Juros sobre Capital Próprio: Outra ferramenta importante usada por holdings operacionais para remunerar seus sócios de forma fiscalmente eficiente já foi marcada para acabar na primeira fase da reforma tributária.

Aumento da alíquota do ITCMD: A reforma tributária tornou a alíquota progressiva do ITCMD obrigatória para todos os estados. Mesmo que a base de cálculo tenha sido salva, a alíquota máxima, hoje em 8%, pode aumentar no futuro, seguindo tendências internacionais que chegam a 20% ou 30%.

O recuo na base de cálculo do ITCMD é uma maravilha na terra. Mas o objetivo maior do Estado, que é aumentar a arrecadação sobre o patrimônio e a renda, continua intacto.

Conclusão: Janela de fechando...

O que essa reviravolta na PLP 108 nos deu? Ela nos deu tempo. Ela reabriu uma janela de oportunidade para quem ainda não organizou sua sucessão.

A mensagem para as famílias empresárias e/ou patrimoniais não é de comemoração, mas de urgência. A hora de constituir, revisar ou acelerar o planejamento sucessório é agora, sob as regras atuais, que se mostraram mais resilientes do que o esperado.

Aja agora: Se você estava paralisado por falta de urgência ou receio, o momento nunca esteve mais preemente. Estruture seu planejamento e realize as doações de cotas enquanto a base de cálculo é o valor contábil e as alíquotas do ITCMD ainda são as atuais.

Planeje para o futuro: A nova holding deve ser estruturada já pensando nas futuras ameaças. Como ela vai operar em um cenário com dividendos tributados? Existem formas de otimizar a estrutura para mitigar este impacto futuro?

Não subestime a complexidade: A reforma tributária deixou o ambiente mais complexo. A vitória no ITCMD não simplificou as coisas. Pelo contrário, mostrou que o jogo será disputado em cada detalhe técnico da legislação.

A holding não está mais no corredor da morte, mas a mensagem ainda é: cautela e urgência. A janela de oportunidade está aberta, mas o som de outras portas se fechando já pode ser ouvido ao longe.

 

 link: https://www.migalhas.com.br/depeso/439936/reforma-tributaria-e-plp-108-holding-ressuscitou

Fonte: Migalhas.com