Reforma tributária e o diferimento para CBS/IBS no agronegócio (parte 2)

Área: Contábil Publicado em 28/07/2025

No artigo anterior, tratamos do instituto do diferimento para IBS e CBS, conforme disposto na Lei Complementar nº 214/2025, quanto aos insumos agropecuários e aquícolas [1].

Elucidamos as hipóteses de aplicação do diferimento, ressaltando sua observância obrigatória, além de não se tratar de um incentivo fiscal.

Dando continuidade ao tema, nesta segunda parte buscaremos elucidar o encerramento do diferimento na cadeia do agronegócio e seus reflexos.

Insumos: encerramento do diferimento e reflexos na cadeia do agronegócio

Enuncia o artigo 138, da Lei Complementar n. 214/2025 quanto ao encerramento do diferimento para IBS e CBS na cadeia do agronegócio, no tocante à aquisição de insumos:

“Art. 138.(…)
5º Nas hipóteses previstas na alínea “a” do inciso I e na alínea “a” do inciso II, ambas do § 2º deste artigo, o diferimento será encerrado caso:
I – o fornecimento do insumo agropecuário e aquícola, ou do produto deles resultante:

  1. a) não esteja alcançado pelo diferimento; ou
  2. b) seja isento, não tributado, inclusive em razão de suspensão do pagamento, ou sujeito à alíquota zero; ou

II – a operação seja realizada sem emissão do documento fiscal.

  • 6º O recolhimento do IBS e da CBS relativos ao diferimento será efetuado pelo contribuinte que promover a operação que encerrar a fase do diferimento, ainda que não tributada, na forma prevista nos §§ 7º e 8º deste artigo.
  • 7º Na hipótese a que se refere a alínea “a” do inciso I do § 5º deste artigo, a incidência do IBS e da CBS observará as regras aplicáveis à operação tributada.
  • 8º Na hipótese a que se refere a alínea “b” do inciso I do § 5º deste artigo, fica dispensado o recolhimento do IBS e da CBS caso seja permitida a apropriação de crédito, nos termos previstos nos arts. 47 a 56.
  • 9º Nas hipóteses previstas na alínea “b” do inciso I e na alínea “b” do inciso II, ambos do § 2º deste artigo, o diferimento será encerrado mediante:

I – a redução do valor dos créditos presumidos de IBS e de CBS estabelecidos pelo art. 168, na forma do § 3º do referido artigo; ou

II – (VETADO).

Como já exposto, a instituição do diferimento para IBS e CBS na cadeia do agronegócio, com relação à aquisição de insumos, por não se tratar de um incentivo fiscal, somente buscou atenuar certos efeitos negativos quanto ao caixa e possível acúmulo de crédito da não cumulatividade, na medida em que o setor possui operações com alíquota zero ou reduzida, bem como imunidade especialmente pelas exportações.

Isto significa dizer que, em algum momento da cadeia, em tese, tais tributos — IBS/CBS —, que não foram recolhidos, deverão ser. É exatamente na previsão legal de encerramento do diferimento que se dá o recolhimento de IBS/CBS.

Prevê o § 5º, do artigo 138, que se encerra o diferimento no fornecimento de insumo no mercado interno ou na importação realizada por contribuinte sujeito ao regime regular para também contribuinte do regime regular,  “caso: I – o fornecimento do insumo agropecuário e aquícola, ou do produto deles resultante: a) não esteja alcançado pelo diferimento; ou b) seja isento, não tributado, inclusive em razão de suspensão do pagamento, ou sujeito à alíquota zero; ou II – a operação seja realizada sem emissão do documento fiscal.”

A primeira hipótese nos revela aspectos de significativa importância:

(i) – podemos ter diferimento em várias etapas da cadeia, pois, se o insumo diferido for utilizado para produzir outro também desta natureza, não se encerra o instituto;

Portanto, por exemplo, conforme artigo 138, Anexo IX, da Lei Complementar n. 214/2025, ao adquirir adubo (item 2), produzo sementes (item 10) que são fornecidas para uma pessoa jurídica realizar o beneficiamento (item 10), tais itens serão objeto de diferimento ao longo das etapas produtivas, até que resulte de um bem não alcançado por este instituto.

(ii) – todavia, se o insumo com diferimento for utilizado para produção de bens ou serviços não alcançados por este instituto, daí temos o encerramento.

Neste aspecto, seguindo o mesmo contexto, ao adquirir adubo (item 2) com diferimento, o contribuinte regular de IBS/CBS (por exemplo, um produtor rural), produz soja e comercializa com redução de alíquota em 60%. Nesta etapa, como o produto resultante do insumo não consta da lista do artigo 138, temos o encerramento do diferimento.

Da mesma forma, como segunda hipótese (artigo 138, § 5º, I, “b”), temos o fim do diferimento caso o insumo adquirido ou o produto elaborado seja isento, não tributado, inclusive em razão de suspensão do pagamento, ou sujeito à alíquota zero.

Dentro desta previsão, por exemplo, um produtor rural contribuinte regular que adquirir insumos com diferimento para produção café (Anexo I), terá o encerramento deste instituto, na medida há tributação à alíquota zero.

Mas, vejam como existe pontos que merecem discussão.

A lei, em tese, não prevê expressamente para redução de 100% da alíquota de IBS/CBS, pois, apesar de o efeito prático ser o mesmo que alíquota zero, o legislador trouxe previsão distinta. Sendo assim, no caso de aquisição de insumos, como a ração para produção de ovos, salvo fertilizados (item 16), haverá o encerramento deste instituto (Anexo XV — item 1)? O encerramento seria por força da previsão do artigo 138, § 5º, I, “a” ou “b”?

Por último, há previsão do fim do diferimento quando a operação for realizada sem emissão de documento fiscal. Neste caso, nos parece que a previsão se dá como medida para impedir condutas ilícitas.

Com o encerramento da fase do diferimento, temos como consequência natural, o recolhimento do IBS e da CBS quanto a tais operações, como explicita o artigo 138, § 6º “O recolhimento do IBS e da CBS relativos ao diferimento será efetuado pelo contribuinte que promover a operação que encerrar a fase do diferimento, ainda que não tributada, na forma prevista nos §§ 7º e 8º deste artigo”.

Por sua vez, o artigo 138, § 6º, da Lei Complementar, expressamente, preceitua que o recolhimento das operações com diferimento serão realizadas “na forma prevista nos §§ 7º e 8º”.

Neste aspecto, o § 7º, do artigo 138, esclarece que na hipótese “a que se refere a alínea “a” do inciso I do § 5º deste artigo” (utilizar o insumo para produzir insumo ou outro bem não diferido), “a incidência do IBS e da CBS observará as regras aplicáveis à operação tributada”.

Equivale dizer: haverá o recolhimento do IBS/CBS, pelo contribuinte que encerrou o diferimento, quanto ao fornecimento de insumos com redução da alíquota de 60%, podendo-se, inclusive, utilizar de créditos do regime não cumulativo. Ademais, nos parece evidente que este contribuinte, ao recolher o IBS/CBS de tais operações de entrada, terá direito ao crédito da não cumulatividade.

De outro lado, o § 8º retrata a previsão da “alínea “b” do inciso I do § 5º” (insumo adquirido ou o produto elaborado seja isento, não tributado, inclusive em razão de suspensão do pagamento, ou sujeito à alíquota zero), asseverando que “fica dispensado o recolhimento do IBS e da CBS caso seja permitida a apropriação de crédito, nos termos previstos nos arts. 47 a 56”.

Logo, apesar de existir o encerramento do diferimento, o que levaria, em regra, ao recolhimento do IBS/CBS das operações diferidas, o § 8º, dispensa o pagamento, quando há saída de insumo ou o produto elaborado seja isento, não tributado, inclusive em razão de suspensão do pagamento, ou sujeito à alíquota zero, desde que exista a permissão para tomada do crédito da não cumulatividade na legislação para os insumos (entrada) que foram objeto de diferimento.

Vale dizer: na prática, sendo um contribuinte regular, ao recolher o IBS/CBS dos insumos objeto de encerramento do diferimento, este teria direito ao crédito, todavia, como saída se dá com isenção, alíquota zero, não tributação ou suspensão, poderia manter o crédito. Com isso, toda a finalidade de diferimento na cadeia ficaria ineficaz, já que teria o recolhimento para posterior pedido de ressarcimento. Ao não recolher o IBS/CBS das operações diferidas, não sofre efeito caixa e não acumula saldo credor adicional, restando mais eficiente o instituto do diferimento.

Temos, ainda, a previsão de encerramento no artigo 138, § 9º, da Lei Complementar nº 214/25, quando do diferimento no fornecimento para produtor rural não contribuinte ou importação por este:

 “§ 9º Nas hipóteses previstas na alínea “b” do inciso I e na alínea “b” do inciso II, ambos do § 2º deste artigo, o diferimento será encerrado mediante:
I – a redução do valor dos créditos presumidos de IBS e de CBS estabelecidos pelo art. 168, na forma do § 3º do referido artigo;”

Para a hipótese de produtor rural não contribuinte, o encerramento do diferimento não resulta em recolhimento por este do IBS/CBS das operações diferidas, mas, na redução do montante do crédito presumido para aqueles que adquirem bens e serviços daqueles (artigo 138, § 9º c/c 168, LC 214/25).

 

Fábio Pallaretti Calcini

Fonte: Conjur