Reforma tributária: cashback e justiça fiscal

Área: Fiscal Publicado em 04/09/2024

Reforma tributária: cashback e justiça fiscal

Mais uma inovação da reforma tributária, o cashback vem como uma estratégia que mira devolver aos contribuintes, exclusivamente às pessoas físicas, parte dos impostos pagos. A priori, apenas grupos socialmente vulneráveis, com baixa renda e com a inscrição ativa no CadÚnico poderão usufruir desse benefício. Estima-se que 73 milhões de pessoas podem ser beneficiadas.

O cashback é um sistema de devolução e recompensa que, de acordo com regras pré-estabelecidas, pode devolver, em dinheiro, parte do valor gasto em compras, gerar pontuações para troca de produtos ou serviços e, também, pontos para programas de milhas aéreas. Trata-se, na verdade, de uma forma de recompensa ao cliente.

Essa estratégia, que deverá ser implementada nos impostos sobre o consumo, como a CBS (Contribuição Sobre Bens e Serviços) e o IBS (Imposto Sobre Bens e Serviços), visa a estimular determinados setores da indústria e economia. Ao devolver parte dos impostos pagos e beneficiar grupos específicos da sociedade, pretende-se reduzir a tributação e, na teoria, amenizar e corrigir as desigualdades sociais, buscando a eficácia da justiça fiscal e a redistribuição de renda.

Partindo do princípio de que a reforma tributária, em seu novo modelo, busca a simplificação e unificação da tributação sobre o consumo, sendo essa de grande importância para a arrecadação, a tendência é que as pessoas de baixa renda destinem uma parte considerável de seus recursos para essa área. Por isso, a implementação de benefícios, como o cashback e a isenção de impostos sobre a cesta básica, é direcionada aos grupos socialmente vulneráveis.

É certo que o gás de cozinha, a energia elétrica, a água e o esgoto estarão abarcados nesse benefício, conforme previsto na Emenda Constitucional nº 132/2023.

O PLP nº 68/2024, em seu Título III, do artigo 100 ao 113, traz os comandos normativos e institucionais da “Devolução Personalizada do IBS e CBS (cashback)”, bem como as alíquotas passíveis de devolução. A CBS, de competência da União, será gerida pela Receita Federal, enquanto o IBS, de competência dos estados e municípios, será gerido pelo Comitê Gestor do IBS. É previsto que o repasse do valor às famílias ocorra em até dez dias após a apuração do agente financeiro, que tem prazo máximo de 15 dias para análise.

Tratando-se das alíquotas, o artigo 106 do mencionado PLP dita que a alíquota de cashback será de:

100% para a CBS e 20% no IBS, na aquisição de botijão de treze quilogramas de gás liquefeito de petróleo;

50% para a CBS e 20% para o IBS, nas operações de fornecimento de energia elétrica, água, esgoto e gás natural e,

20% para a CBS e para o IBS, nos demais casos.

Permite-se, também, de acordo com o artigo 107, que a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios, através de lei específica, fixem percentuais diferentes dos previstos, em razão de outros critérios a serem definidos.

Aumento do cashback

Em recente discussão no Grupo de Trabalho da Regulamentação da Reforma Tributária, na Câmara, participantes defenderam o aumento do cashback de 100% sobre os produtos a serem consumidos pelas famílias inscritas no CadÚnico. A sugestão foi de elevar a porcentagem de cashback da CBS das contas residenciais de 50% para 100% (nas contas de energia elétrica, água, esgoto e gás natural) e de 20% para 50%, no caso dos demais produtos.

O sistema é bem-sucedido em diversos países. Na América do Sul, Uruguai, Colômbia, Bolívia, por exemplo. Na Bolívia, parte do IVA (Imposto sobre o Valor Agregado) é devolvida àqueles que são elegíveis ao sistema. No Uruguai, os lojistas se cadastram no programa do governo que realiza a desoneração do IVA para a população de baixa renda. O Canadá foi um dos países espelho para a implementação desse modelo de benefício proposto no PLP 68/2024. Lá, o IVA é devolvido em valores fixos.

Algumas regiões do Brasil também possuem sistemas de devolução de valores pagos. No estado de São Paulo, há a nota fiscal paulista, cujo objetivo é estimular os consumidores a exigirem o documento fiscal/NF na hora de realizar uma compra, gerando assim créditos passíveis de reembolso, sorteios e diversas outras formas de utilização do crédito gerado, como abatimento no IPVA. Outro estado que aprovou um programa parecido é o Rio Grande do Sul, com o programa Nota Fiscal Gaúcha.

Espera-se que, com esses atrativos, a evasão e sonegação fiscal sejam combatidas, e a arrecadação de impostos aumente, uma vez que esses benefícios incentivam os consumidores/contribuintes a solicitarem as notas fiscais no ato da compra, permitindo maior rastreio e controle fiscal.

No tocante à sua implementação, o artigo 113 do PLP 68/2024 traz que as devoluções serão calculadas com base no consumo familiar realizado a partir de janeiro de 2027 para a CBS e janeiro de 2029 para o IBS.

Dentre as diversas mudanças que a reforma tributária propõe, a criação de um sistema de devolução de valores e incentivo ao consumo de certos produtos parece bastante interessante e factível. Espera-se que, com análises corretas e uma implementação adequada, os benefícios sejam notáveis. O Pix, a modalidade mais usada entre contas bancárias brasileiras, poderá ser adotada para a transferência do cashback, uma vez que o sistema já existe, bastando ser adequado.

É essencial que o foco deste novo sistema permaneça na justiça fiscal e na redução das desigualdades. Do contrário, poderá tornar-se ineficiente, desigual e sujeito a fraudes. Além disso, deve-se garantir a liberdade dos estados e do poder regulador para que caminhos efetivos sejam criados e que os cidadãos paguem seus tributos, respeitando-se as garantias fundamentais, o patrimônio, os rendimentos e a capacidade contributiva, fazendo com que esses benefícios também gerem investimentos no aspecto social.

Fonte: Consultor Jurídico