Números sobre a cesta básica geram divergências em grupo de trabalho

Área: Fiscal Publicado em 14/06/2024

Números sobre a cesta básica geram divergências em grupo de  trabalho

O impacto da cesta básica proposta pelo governo abriu divergência entre a Secretaria Extraordinária para a Reforma Tributária (Sert) do Ministério da Fazenda, a Receita Federal e os supermercadista nas reuniões fechadas do grupo de trabalho da Câmara sobre a regulamentação da reforma, segundo o presidente da Associação Brasileira de Supermercados (Abras), João Galassi, e dois deputados ouvidos pelo Valor. A Sert nega que haja diferenças com a Receita. O Fisco não se manifestou.

A divergência teria ocorrido pelo uso de bases de dados diferentes para medir qual será o peso de cada produto na arrecadação e qual o valor da alíquota média cobrada sobre todos os alimentos. Os números variam de tributação média de 12,3% na conta da Sert a 15,8%, em conta apresentada pela Abras com dados que seriam da Receita.

O projeto de lei do governo estabelece três grupos de alimentos: 18 itens com alíquota zero, como arroz, feijão, massas, café e leite; uma lista com tributação favorecida, reduzida em 60%, onde estão carnes, queijos, bolachas, sucos, óleos, tapioca e sal; e os demais alimentos, com alíquota-padrão (26,5%), como os ultraprocessados e salmão.

Para determinar onde cada produto ficará inserido, o governo estudou a tributação atual e o valor nutricional, além do peso de cada um na arrecadação. Se as carnes ficarem com alíquota zerada, como defende a bancada ruralista, a alíquota-padrão terá que aumentar para 27,1% para manter a atual arrecadação.

Segundo Galassi, houve divergência nessa conta durante as reuniões entre os técnicos da iniciativa privada, da Sert e da Receita. Para a Abras, o valor que o governo arrecadará com os produtos vendidos em supermercados - alimentícios, higiene, limpeza e bebidas - está subestimado em R$ 74 bilhões, o que abre espaço para zerar a alíquota das carnes e outros produtos sem alterar a alíquota-padrão. “Temos convicção de que, se colocarem as proteínas na cesta básica nacional, não haverá nenhuma preocupação de redução de carga tributária”, diz.

A Abras usou a base nacional de vendas dos supermercados em 2023 para calcular o peso de cada grupo de alimentos no consumo e, consequentemente, na arrecadação. Já a Sert teria adotado a Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) 2017-2018, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em que os entrevistados declaram quanto consomem de cada item. Segundo dados aos quais o Valor teve acesso, a Receita se baseou nas notas fiscais de entrada dos produtos - o que não considera eventuais benefícios tributários da loja.

Cada um tem defendido a sua metodologia e apresentado falhas na do outro. Para Galassi, a base da Abras é mais atual e fiel, porque o governo teria superestimado o peso dos produtos da cesta básica e subestimado que os alimentos com alíquota cheia representariam quase metade do consumo.

Já o diretor da Sert, Rodrigo Orair, afirmou que a tabela exposta pela Abras “não faz sentido”. “O cálculo do impacto na alíquota é feito com o modelo do tax Gap que não usa dados da POF. A POF é para avaliar impacto distributivo. Ela pergunta o quanto as famílias consomem. Porém, nem tudo que elas compram é em supermercado. Pode ser na padaria, na feira, etc”, declarou. Por isso, na visão da Sert, é mais adequado utilizar a POF do que as notas fiscais. “Já os supermercados avaliam o quanto eles vendem. Não necessariamente para as famílias. Supermercados vendem para mercearias, restaurantes etc. Cada base de dados tem  prós  e  contra”, disse.

Outro técnico destacou, reservadamente, que a tabela comprova que, mesmo nas contas dos supermercados, haverá redução nos impostos sobre os alimentos.

Já a Receita foi procurada pelo Valor e não se manifestou.

Para o deputado Joaquim Passarinho (PL-PA), um entendimento sobre os cálculos poderá permitir a inclusão da carne na cesta básica sem aumentar a alíquota-padrão. “Teremos nova reunião terça-feira e tenho expectativa de que essa discussão avance”, afirmou.

Fonte: Valor Econômico