Notícia - Turmas do TST divergem sobre critério para validar adicional de insalubridade

Área: Pessoal Publicado em 10/07/2025

Fonte: Jornal Valor Econômico 

Alguns ministros da Corte seguem a conclusão do STF sobre o uso do Equipamento de Proteção Individual para a aposentadoria especial.

Decisões recentes de diferentes turmas do Tribunal Superior do Trabalho (TST) sobre adicional de insalubridade mostram divergência quanto à aplicação do entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF), que mantém a aposentadoria especial, mesmo quando a empresa fornece Equipamento de Proteção Individual (EPI). Pago aos trabalhadores que exercem a função em ambientes ou sob condições que podem prejudicar a saúde, o adicional varia de 10% a 40% do salário mínimo, a depender do grau de exposição a agentes nocivos.

A judicialização da aposentadoria especial é relevante. Em março deste ano, por exemplo, 95,4% dos benefícios desse tipo foram concedidos pelo INSS por ordem judicial, sendo 757 o total de concessões. Em relação a 2024, esses números se mantêm constantes. O Ministério da Previdência não tem dados sobre adicional de insalubridade, que é pago pelas empresas, mas após o julgamento do STF sobre aposentadoria especial ser replicado em julgamentos trabalhistas, a judicialização sobre o assunto é crescente, segundo especialistas.

O Supremo definiu, em 2015, em repercussão geral, que a mera declaração de eficácia do EPI no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) não é suficiente para afastar o direito à aposentadoria especial. Seria necessária a comprovação da efetiva neutralização da nocividade (Tema 555).

Segundo Leonardo Rolim, especialista em Direito Previdenciário, o próprio Ministério da Previdência sempre interpretou que os EPIs não eram suficientes para ruído, então a decisão do STF sobre aposentadoria especial era esperada. “Contudo, com base nessa decisão, a Receita Federal passou a não considerar o EPI de ruído para isentar a empresa de pagar o adicional para o custeio da aposentadoria especial”, diz.

A aposentadoria especial é um benefício previdenciário concedido ao trabalhador pelo exercício de atividades expostas a agentes nocivos à saúde ou integridade física. Na prática, o recebimento do benefício do INSS é antecipado porque o tempo de contribuição é menor. Há judicialização porque, segundo Rolim, pessoas aposentadas decidem ir ao Judiciário alegando que trabalharam em local ou sob condição insalubre e merecem receber o valor correspondente à aposentadoria especial.

Para ele, a lógica da discussão previdenciária e a da trabalhista é a mesma. “A insalubridade é em função do agente nocivo e a aposentadoria especial idem. O que vale para um vale para o outro, mas a regra não pode ser estanque, tem que avaliar caso a caso”, afirma. Segundo o especialista, há que se considerar, por exemplo, que o EPI pode ter evoluções tecnológicas e passar a proteger mais efetivamente.

“Existem decisões em Turma e na SDI [Seção de Dissídios Individuais] que indicam divergência quanto às circunstâncias em que o EPI afasta o adicional”, destaca Rudi Lehman, sócio do Warde Advogados.

Embora reconheça tais divergências, a advogada Libia Alvarenga, sócia na área trabalhista da Innocenti Advogados, aponta que muitas decisões aplicam a Súmula nº 80 do TST. De acordo com esta orientação da Corte trabalhista, os EPIs que neutralizam a insalubridade “excluem a percepção do adicional”. A advogada lembra também que, enquanto o tema não for afetado para julgamento como recurso repetitivo, permanecerá sujeito a entendimentos divergentes.

Em um dos julgados do TST, analisando recurso da empresa, o relator, ministro Breno Medeiros, afirmou que o precedente fixado pelo STF não define quais condições de trabalho configuram a exposição do empregado ao agente insalutífero ruído, situação que decorre, caso a caso, das condições de trabalho verificadas em cada situação concreta e à luz de elementos de prova (0000637-10.2023.5.12.0058). A 5ª Turma foi unânime para não aplicar a decisão do Supremo.

De acordo com o advogado da empresa no caso, Jorge Matsumoto, sócio do Bichara Advogados, a decisão do STF se deu pelo viés previdenciário, se debruçando a respeito dos efeitos do ruído sobre os trabalhadores na aposentadoria especial. “A questão foi se o EPI é eficaz”, afirma. Matsumoto diz que, a partir daí, advogados de trabalhadores começaram a destacar em seus pedidos que, se o Supremo considerou que fornecer EPI não é suficiente para afastar o ruído, não seria necessário fazer a prova nos casos de insalubridade.

Insalubridade e aposentadoria especial decorrem de agente nocivo”

— Leonardo Rolim

Matsumoto contesta esse raciocínio. “Você não pega a decisão do STF e usa de forma literal, sem análise fática para questão trabalhista”, afirma. Para ele, a decisão do STF foi “perturbadora” ao indicar que não adianta a empresa investir em EPI porque nada disso pode ser suficiente para afastar a insalubridade no ambiente de trabalho. “No âmbito trabalhista, é necessária a análise fática particular do ambiente e das condições de trabalho, e se o EPI é eficaz nessas condições”.

Em outra decisão do TST, o ministro Douglas Alencar Rodrigues afirmou que as questões previdenciárias e trabalhistas exigem compreensão distinta, pois partem de legislações específicas. “Não há razão para estender a motivação adotada pelo STF em decisão que trata dos critérios de aposentadoria especial”, afirma ele (1500-11.2016.5.03.0029).

Para Daniel Domingues Chiode, sócio do Chiode Minicucci Advogados, esta decisão afastou corretamente a aplicação alargada da decisão do Supremo. Para o advogado, o problema é que o sistema de precedentes brasileiro ainda não está maduro, o que permite usar um mesmo precedente em sentidos diametralmente opostos.

Julgados da 4ª Turma também afastaram a decisão do STF. Em duas decisões unânimes, o relator, ministro Alexandre Luiz Ramos, explica que a decisão do Supremo se refere a questões previdenciárias e não altera os critérios estabelecidos pela legislação trabalhista e pela jurisprudência do TST para o adicional de insalubridade (processos nº 0001100-28.2022.5.09.0071 e nº 0020320-23.2022.5.04.0662).

Em março deste ano, foi a 1ª Turma do TST que decidiu que a decisão do STF não se aplica. O relator, ministro Amaury Rodrigues Pinto Junior pontuou que o Supremo não tratou da percepção de adicional de insalubridade nas relações de trabalho. Mas de processo de aposentadoria especial, considerando a redução legal do tempo para aposentadoria, sendo inaplicável ao caso (processo nº 1001690-15.2021.5.02.0201).

Já a 6ª Turma, em maio, manteve decisão de segunda instância que estava “em sintonia” com o precedente do Supremo. O relator, ministro Augusto Cesar Leite de Carvalho, destacou que o STF, ao julgar o tema, entendeu que o uso de protetor auricular, ainda que reduza a hostilidade dos ruídos a níveis toleráveis, não confere total proteção ao trabalhador submetido a ruídos excessivos (processo nº 0020787-53.2015.5.04.0304).

No mês de fevereiro, por maioria de votos, a 7ª Turma do TST concedeu o adicional de insalubridade com base na decisão do STF. Na decisão, o relator, ministro Claudio Mascarenhas Brandão, afirmou que foi ressaltada pelo STF a impossibilidade de se garantir uma eficácia real na eliminação dos efeitos do agente nocivo ruído com o simples uso de EPI, considerando que são inúmeros os fatores que influenciam na sua efetividade.

Segundo o relator, “não se trata de copiar uma decisão, de modo estritamente literal, e aplicá-la a outros casos, mas extrair dela a substância e, por serem compatíveis com questões jurídicas assemelhadas, resolvê-los com base em fundamentos idênticos” (processo n° 1000992-42.2022.5.02.0211).