Notícia - STF analisará cobrança de contribuição ao INSS sobre vale-refeição e vale-transporte

Área: Pessoal Publicado em 02/07/2025

Fonte: Portal Migalhas 

2ª Turma decidiu que a questão é constitucional e deve ser analisada pela Corte.

O Supremo Tribunal Federal (STF) poderá provocar uma reviravolta sobre a incidência de contribuição previdenciária nas parcelas descontadas do salário do empregado para pagar o vale-refeição e o vale-transporte. Uma decisão da 2ª Turma surpreendeu o mercado ao declarar que vai analisar a cobrança. Como no ano de 2020 a Corte havia decidido que essa questão é infraconstitucional, a última palavra seria do Superior Tribunal de Justiça (STJ), favorável à tributação

Nesses benefícios, parte do custo cabe ao trabalhador e outra parcela é bancada pelo empregador. A parte que é descontada do salário do trabalhador integra o salário de contribuição, que é a base de cálculo da contribuição previdenciária paga pela empresa, sob alíquota de 20%. Sobre a parcela que a própria empresa custeia do benefício, por outro lado, não incide contribuição previdenciária, segundo o próprio STF (RE 487410).

No ano de 2022, chegou ao Supremo o processo de uma empresa de engenharia questionando decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) favorável à tributação. Na época, acompanhando o relator, Luiz Fux, os ministros entenderam que a questão é infraconstitucional (ARE 1370843).

No ano passado, o STJ firmou entendimento no sentido de que as parcelas de vale-transporte, vale-refeição e alimentação, e plano de assistência à saúde estão sujeitas à contribuição previdenciária (Tema 1.174).

A decisão do STF, no entanto, de não analisar a questão, foi revertida, por unanimidade, na 2ª Turma da Corte, pouco antes do recesso do Judiciário. O ministro André Mendonça, novo relator do processo, tinha entendido que não era o caso de analisar a ação, por se tratar de questão infraconstitucional.

Dias Toffoli, porém, concordou com o contribuinte que a discussão gira em torno do conceito constitucional de “rendimentos do trabalho”, incluído no artigo 195, inciso I, alínea “a” da Constituição pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998. Ele dispõe que incide contribuição destinada ao custeio da previdência “sobre a folha de salários e demais rendimentos do trabalho”.

Mendonça mudou o próprio voto e os demais ministros da 2ª Turma o acompanharam (ARE 1260750).

Toffoli ainda não se manifestou sobre o mérito, que é o pedido do contribuinte para afastar a incidência da contribuição previdenciária. Mas ele entendeu que a Corte deve analisar o alcance da expressão “rendimentos do trabalho” - apesar de já ter julgado a abrangência da folha de salários no ano de 2017 (RE 565160).

“Cabe investigar se é relevante, considerando-se os direitos sociais fundamentais ao transporte e à alimentação do trabalhador, a distinção entre prestações dadas pelo empregador para o trabalho e aquelas dadas pelo trabalho e, nessa seara, se compõem os rendimentos do trabalhador os valores atinentes a tais despesas necessárias para o trabalho”, afirma o ministro em seu voto. Ainda não há data marcada para o julgamento.

O argumento da empresa é que a parcela do vale-refeição e do vale-transporte custeada pelo empregado não consiste em pagamento por serviço prestado. Seu caráter é indenizatório, conforme explicam os advogados Lucas Heck, sócio e fundador do Heck Advogados, e Paulo Coimbra, professor titular de direito tributário da UFMG, que atuaram na causa.

“O Supremo deveria superar o entendimento do STJ”

— Carolina Rigon

Conforme Alessandro Cardoso, sócio do Rolim Goulart Cardoso Advogados, a discussão é importante para a maioria das grandes empresas no país. “O impacto é significativo, principalmente para a indústria”, diz. “O pagamento dos benefícios tem repercussão mensal, além de o julgamento gerar a expectativa de que a empresa consiga recuperar os valores recolhidos indevidamente no passado, em caso de entendimento favorável.”

Para Carolina Rigon, sócia do ALS Advogados, o Supremo deveria superar o entendimento do STJ. Isso porque ele não levou em conta que a natureza jurídica da verba não muda por causa da mecânica do desconto do salário do empregado. “São valores destinados a garantir a dignidade do trabalhador, e não para remunerá-lo”, defende.

“A decisão do STF é uma oportunidade importante para que seja reafirmado o conceito de remuneração, que deve ser atrelado exclusivamente àquilo que constitui um pagamento pelo trabalho ou pela prestação de serviço”, diz. “Ficam excluídos, assim, os valores pagos para viabilizar o trabalho, com a finalidade de fornecer as condições de deslocamento e subsistência, que são direitos fundamentais”, explica ela.

Para os advogados da causa, é impossível incluir verbas de caráter compensatório, como é o caso do vale-transporte e do vale-refeição, no conceito de remuneração. Isso porque elas servem apenas para auxiliar na garantia de direitos sociais do trabalhador. “Não servem para remunerar o serviço prestado, mas apenas garantir que ele seja prestado”, afirma Lucas Heck.

Além desse recurso que será analisado pela 2ª Turma, chegaram ao Supremo dois outros processos que questionam diretamente o entendimento do STJ favorável ao Fisco. Um deles será analisado pela Corte (RE 1557147), mas o outro foi devolvido ao tribunal de origem (RE 1557148). A presidência entendeu que a questão já foi analisada no Tema 1.221.

Esses casos, contudo, eram mais restritos que a tese do STJ. Eles trataram da possibilidade de exclusão dos valores relativos ao Imposto de Renda (IR) e contribuição previdenciária do empregado e trabalhador avulsos, retidos na fonte pelo empregador, sobre a base de cálculo da contribuição previdenciária patronal e das destinadas ao SAT/RAT e a terceiros (Sistema S).