Governo tem desafio de enviar proposta de reforma do Imposto de Renda em 2025
Área: Fiscal Publicado em 05/02/2025Governo tem desafio de enviar proposta de reforma do Imposto de Renda em 2025
Em 2025, o governo deverá enviar ao Congresso Nacional sua proposta de reforma do Imposto de Renda, um tema que tumultuou a cena econômica no fim de 2024 e representa um fator de insegurança, na visão de especialistas, pelo potencial impacto nas contas públicas. Precisará, também, concluir a reforma dos tributos sobre o consumo com a proposição de novas leis, o que pode reacender pressões de setores da economia e reacender a disputa entre Estados por recursos.
A proposta de reforma do IR está pronta, disse o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, em encontro com a imprensa em 20 de dezembro. Só não foi enviada ao Congresso ainda porque foi detectada uma inconsistência no modelo aplicado às mudanças no Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ).
Até então, se sabia que seria enviada uma proposta para alterar o Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF), estabelecendo o limite de isenção em R$ 5 mil e criando uma tributação mínima de até 10% para rendas mensais acima de R$ 50 mil. Só não estava claro se a proposta para o IRPJ seguiria simultaneamente.
Segundo Haddad, é possível que a reforma do IR, que tem vários aspectos, seja encaminhada ao Congresso em mais de um projeto de lei. “Eu acredito que, no caso da renda, será mais um projeto, porque são temas diferentes, são abordagens diferentes ao mesmo tempo”, comentou. É candidata a integrar o pacote uma proposta que reformula a tributação de aplicações financeiras, cujo objetivo central é uniformizar alíquotas.
“O governo não pretende votar um texto que não seja neutro”, afirmou o ministro, ao falar sobre o risco de haver renúncia fiscal com o aumento da isenção de rendas de pessoas físicas até R$ 5 mil. Segundo ele, a ideia é não ter ganho nem perda com as mudanças. “O governo firmou esse compromisso com os líderes de partido, esse acordo básico, como aconteceu com o caso do consumo.”
Há, porém, uma grande incerteza entre analistas sobre esse pacto. Se não houver a compensação pretendida pelo governo, ou se a taxação dos ricos ficar aquém do proposto, a perda poderá ser de até R$ 35 bilhões, nas contas do próprio Ministério da Fazenda.
Na reforma sobre o consumo, ainda falta votar o Projeto de Lei Complementar (PLP) 108, que regula o funcionamento do Comitê Gestor do Imposto sobre Bens e Serviço (IBS), um colegiado formado por representantes de Estados e municípios. E o Executivo também ainda precisa enviar ao Congresso projetos de lei tratando dos quatro novos fundos criados na reforma tributária e o que vai fixar alíquotas do Imposto Seletivo.
Recolhimento dos novos impostos
Já fora do Legislativo, haverá uma corrida contra o tempo para estruturar o sistema de recolhimento dos novos impostos e para serem editadas as normas administrativas do IBS e da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS). Esse trabalho foi facilitado pela criação do Comitê Gestor ainda este ano.
Originalmente, o comitê seria criado por meio do PLP 108, a ser votado em 2025, mas avaliou-se que dessa forma os trabalhos atrasariam. Por isso, a criação foi antecipada no PLP 68, que detalha o funcionamento dos novos tributos e foi aprovada no final do ano passado.
“O Comitê Gestor é uma grande incógnita”, afirmou o ex-secretário da Receita Federal José Tostes, desfazendo a noção que o PLP 108 envolveria menos polêmica que o PLP 68. A dúvida está em como funcionará na prática.
Segundo Tostes, o comitê terá funções executivas de arrecadar, efetuar compensações, distribuir fluxo de receitas e julgar contenciosos. Por outro lado, ele vai apenas coordenar a fiscalização, a cobrança, a representação administrativa e judicial, que seguirão exercidas pelos Estados e municípios. Fazer a coordenação entre essas tarefas será um desafio “brutal”, acredita.
“Se eu estou aqui no Distrito Federal e tem uma empresa no Rio Grande do Sul que vende para cá, eu posso ir lá fiscalizar, porque estou recebendo [o tributo] no destino”, exemplificou. “Então, isso exigirá uma coordenação muito fina.” Há risco de uma empresa ser alvo de auditorias simultâneas, disse.
A previsão que o Comitê Gestor julgará contenciosos do IBS enquanto a União julgará os da CBS é outro ponto de preocupação de Tostes e outros especialistas. O receio é que haja decisões divergentes, quando a ideia é que os dois tributos sejam gêmeos. O PLP 108 estabelece mecanismos para harmonizar o entendimento. Mesmo assim, o risco de judicialização não é descartado.
Segundo o ex-secretário, o Comitê de Harmonização e o Fórum de Harmonização Jurídica, previstos no PLP 108, não vão julgar processos. As funções são de interpretação e harmonização das normas. Porém, não têm função na estrutura do contencioso.
Tostes, que também foi secretário estadual de Fazenda, alerta para o risco de União e algum Estado interpretarem de forma diferente uma mesma informação. Nessa fase de contencioso, a única forma de o contribuinte resolver a divergência será por meio da Justiça, disse.
“A gente precisa ver como o Congresso vai terminar esse desenho da reforma, inclusive os seus órgãos de julgamento, para trabalhar em alguma coisa que não comece a virar outro monstro, que é a gente começar a ter decisões diferentes entre CBS e IBS”, comentou o presidente do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), Carlos Higino Ribeiro de Alencar, em entrevista ao Valor no início de dezembro.
Na reforma, foram criados quatro novos fundos para transferir dinheiro aos Estados. São eles: o de compensação de benefícios fiscais, o de desenvolvimento regional, o de diversificação econômica da Amazônia, e o de desenvolvimento da Amazônia Ocidental e Amapá. O primeiro deles deverá receber um aporte de R$ 9 bilhões já em 2025. Porém, a lei que os criará ainda não foi enviada ao Congresso Nacional.
O secretário extraordinário da Reforma Tributária, Bernard Appy, disse que os projetos que tratarão dos fundos tratarão basicamente da distribuição de recursos. Um dos fundos, o que trata da Amazônia, será objeto de projeto de lei complementar, informou.
Está prevista também a fixação de alíquotas do Imposto Seletivo, que causou polêmica este ano pelo debate sobre a incidência sobre armas, bebidas açucaradas e extração mineral. Existe a possibilidade de essas discussões serem reabertas no Congresso Nacional.
Fonte: Valor Econômico