Artigo: Solicitação de exame de gravidez na admissão e demissão de empregadas

Publicado em 20/07/2021 09:30 | Atualizado em 23/10/2023 13:25
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Inicialmente, cumpre informar que a CLT, em seu art. 373-A, inciso IV, dispõe que é vedado ao empregador exigir atestado ou exame, de qualquer natureza, para comprovação de esterilidade ou gravidez, na admissão ou permanência no emprego.

 

Neste sentido, ainda, a Lei n° 9.029/95 proíbe expressamente a adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa, para efeito de acesso ou manutenção da relação de emprego, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade.

 

Segundo a norma, constituem crime, punível com pena de detenção de um a dois anos e multa:

 

a) a exigência de teste, exame, perícia, laudo, atestado, declaração ou qualquer outro procedimento relativo à esterilização ou a atestado de gravidez;

 

b) a adoção de quaisquer medidas, pelo empregador, que configurem:

 

- indução ou instigamento à esterilização genética;

- promoção do controle de natalidade, assim não considerado o oferecimento de serviços e de aconselhamento ou planejamento familiar, realizados por meio de instituições públicas ou privadas, submetidas às normas do Sistema Único de Saúde (SUS);

 

Além disso, a Portaria do extinto Ministério do Trabalho e Emprego n° 41/2007, no seu art. 1º, proíbe ao empregador que, na contratação ou na manutenção do emprego do trabalhador, faça a exigência de quaisquer documentos discriminatórios ou obstativos para a contratação, especialmente certidão negativa de reclamatória trabalhista, teste, exame, perícia, laudo, atestado ou declaração relativos à esterilização ou a estado de gravidez.

 

Assim, a legislação veda expressamente a solicitação de exame de gravidez quando da admissão de empregada, sendo que, a exigência destes exames, em desacordo com a legislação, é considerada uma prática discriminatória, a qual poderá ocasionar, em eventual reclamatória trabalhista, o pagamento de indenização por danos morais, conforme o julgado abaixo:

 

“(...) DANO MORAL – EXAME DE GRAVIDEZ. Considera estritamente discriminatória a exigência de teste de gravidez em dois momentos: primeiro, na ocasião admissional, em que a exigência de tal exame poderia levar a uma discriminação nas contratações das mulheres gestantes; e no segundo momento, ao longo do contrato de trabalho, pois presumir-se-ia que a demissão guardaria uma natureza de flagrante discriminação e ofensa a dignidade, valor constitucional protegido pela CF/88. (...)” (TRT-11-RO: 00000610420175110010, Relator: MARCIA NUNES DA SILVA BESSA, Data de Julgamento: 02/09/2019, 2ª Turma, Data de Publicação: 04/09/2019).

 

No entanto, há divergência na doutrina e na jurisprudência acerca da possibilidade de o empregador, após dispensar a empregada, solicitar exame de gravidez dentre os demais exames demissionais, integrantes do PCMSO.

 

Para uma primeira linha de entendimento, é vedado ao empregador solicitar esse tipo de exame à trabalhadora, pois se configura em conduta discriminatória, ensejando na violação da intimidade e da privacidade da empregada, mesmo no momento da demissão. No mais, para essa corrente, a exigência do referido exame no ato demissional pode ensejar na caracterização do dano moral e até crime, à luz do disposto no art. 2°, da Lei n° 9.029/1995.

 

Por outro lado, corrente ampliativa defende a possibilidade da realização do exame médico gestacional no ato da demissão pelo empregador. Para essa vertente, a Lei n° 9.029/1995 teve por finalidade evitar discriminação contra as mulheres, impedindo que o empregador exigisse o atestado como condição para efeito de acesso à relação de trabalho, isto é, na admissão ou de sua manutenção. Prelecionam que a lei deve ser interpretada como um mecanismo para se evitar a discriminação da mulher, quando da sua contratação ou promoção. No entanto, no caso de demissão, o exame gestacional só evita um mal maior contra a trabalhadora, qual seja, a perda do emprego.

 

Nessa toada, cumpre ressaltar que, recentemente, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) não concedeu indenização por dano moral a uma empregada em razão da exigência de teste de gravidez pela empresa no momento da sua demissão. Isto porque, conforme a tese vencedora, a conduta não foi discriminatória, nem violou a intimidade da trabalhadora, uma vez que visou dar segurança jurídica ao término do contrato de trabalho, já que a medida, ao mesmo tempo, resguarda a responsabilidade do empregador e representa uma defesa para a trabalhadora, que terá garantido o seu emprego e salário, caso seja confirmada a gravidez, nos moldes do art. 10, inciso II, alínea "b", do ADCT da CF/1988.

 

Para corroborar o exposto, é a seguinte notícia publicada no portal do TST, no dia 16.06.2021:

 

“Empregada submetida a teste de gravidez na demissão não será indenizada

 

Por maioria, a Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou o recurso de uma ex-empregada que pretendia o pagamento de indenização por danos morais porque a empresa havia exigido a realização de exame de gravidez no ato demissional. Segundo a tese vencedora, a conduta não foi discriminatória nem violou a intimidade da trabalhadora, uma vez que visou dar segurança jurídica ao término do contrato de trabalho.

 

Teste obrigatório

 

Admitida em janeiro de 2009 como líder de produção, a trabalhadora disse que, no ato demissional, em fevereiro de 2015, o médico do trabalho exigiu o exame de gravidez, informando que, se ela estivesse grávida, não seria dispensada. A exigência foi vista como abusiva pela trabalhadora. “Se estivesse grávida, certamente não me dispensariam”, afirmou, ao pedir indenização de 20 mil.

 

O que diz a lei

 

A legislação trabalhista garante a estabilidade provisória da gestante até cinco meses após o parto. Se nem a empresa nem a empregada souberem da gravidez, e se ela confirmar que estava grávida durante o contrato ou no prazo do aviso prévio, a empresa deve reintegrá-la espontaneamente ou indenizá-la pelo período correspondente. Ou seja, o fato de a empregada não informar o empregador da sua gestação não é obstáculo para a estabilidade provisória.

 

Por sua vez, o artigo 2º da Lei 9.029/1995 proíbe a exigência de atestados de gravidez para efeitos admissionais ou de permanência no emprego. Desde setembro de 2016, tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei 6074/2016, a fim de permitir a exigência de teste ou exame de gravidez por ocasião da demissão, de forma a garantir o exercício do direito à estabilidade de emprego à gestante.

 

Previsão legal

 

O juízo da 10ª Vara do Trabalho de Manaus e o Tribunal Regional do Trabalho da 11ª Região (AM) indeferiram a indenização. Segundo o TRT, o pedido de exame não foi feito nem na admissão nem durante o contrato, o que a legislação proíbe. O juízo observou que não estava concordando com a conduta da empresa nem a estimulando. “Só não há previsão legal”, registrou. 

 

Segurança jurídica

 

Prevaleceu, no julgamento do recurso de revista da empregada, o voto do ministro Agra Belmonte, que afastou a caracterização de ato discriminatório ou violador da intimidade. “A conduta visa dar segurança jurídica ao término do contrato de trabalho e acaba representando elemento a favor da trabalhadora”, afirmou. “Caso ela esteja grávida – circunstância muitas vezes que ela própria desconhece – o empregador, ciente do direito à estabilidade, poderá mantê-la no emprego sem que ela necessite recorrer ao Judiciário”.

 

Proteção

 

Em reforço à tese vencedora, o ministro Alberto Bresciani acentuou que a medida ao mesmo tempo resguarda a responsabilidade do empregador e representa uma defesa para a trabalhadora. No entender do ministro, a conduta se adequa ao sistema jurídico. “A decorrência legal é a proteção do trabalho e da empregada, que tem a garantia de que a empresa sabia de sua gravidez”, concluiu.

 

Vontade da mulher

 

Em voto vencido, o relator, ministro Maurício Godinho Delgado, considerou a conduta da empresa uma intervenção no âmbito da personalidade da mulher. Segundo ele, o empregador pode ter tido a melhor das intenções, mas invadiu a intimidade da trabalhadora. “Esse tema é superior à vontade do empregador”, afirmou.

 

(RR/CF)

 

Processo: RR-61-04.2017.5.11.0010”

 

Porém, ressaltamos que, mesmo nesta situação, a realização do exame médico demissional gestacional somente é válida se houver o conhecimento prévio da sua realização pela empregada, não podendo o empregador realizá-lo sem a sua autorização.

 

Portanto, por todas as previsões legais citadas acima e, principalmente, em função de a lei proibir a exigência de teste, exame, perícia, laudo, atestado, declaração ou qualquer outro procedimento relativo à esterilização ou a atestado de gravidez, é vedado ao empregador solicitar tais exames quando da admissão ou permanência no emprego da trabalhadora.

 

Ocorre que, como há uma discussão judicial a respeito dessa previsão legal, algumas empresas, entendendo a possibilidade da realização desse exame na demissão, solicitam que ele seja feito, sendo necessária a concordância da empregada para isso e, se houver alguma discussão sobre o assunto, discutem isso judicialmente, cabendo a decisão final à Justiça do Trabalho, se acionada neste sentido. Em tal situação, apenas ressaltamos a existência de algumas decisões favoráveis a essas empresas, inclusive do TST, como a mencionada acima.

 

Por fim, lembramos que há uma situação em que é necessária a comprovação de gravidez por parte da empregada, que ocorre quando a empresa comunica a dispensa e a empregada anuncia estar grávida. Nesta situação específica, como a comunicação da gravidez partiu da empregada, esta deverá apresentar o competente exame médico que comprove a referida gravidez. Nesta situação, não há qualquer impedimento legal da exigência da comprovação da gestação pela empregada.

 

Alany Martins

Consultora da Área Trabalhista e Previdenciária