Artigo - Dispensa discriminatória de empregado portador do vírus HIV ou de outra doença grave ao término do contrato de experiência

Publicado em 13/11/2023 11:42 | Atualizado em 14/12/2023 13:49
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Em regra geral, a empresa pode dispensar o empregado, sem justa causa, ainda que ele seja portador de alguma doença ou esteja em tratamento médico, tendo em vista que não há qualquer vedação legal quanto a esta situação.

Contudo, para que a dispensa sem justa seja possível, o empregado deverá ser considerado apto para o trabalho. Para tanto, o trabalhador deve realizar o exame médico demissional respectivo, o qual deve constar APTO, para que seja válida a dispensa sem justa causa.

Contudo, a jurisprudência trabalhista possui entendimento sumulado de que a dispensa sem justa causa de empregado portador do vírus HIV ou de outra doença grave que suscite estigma ou preconceito é considerada discriminatória, sendo devida a reintegração do trabalhador ao emprego.

Nesse sentido, segue a íntegra do texto da Súmula nº 443, do Tribunal Superior do Trabalho – TST:

“Súmula nº 443 do TST

DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. PRESUNÇÃO. EMPREGADO PORTADOR DE DOENÇA GRAVE. ESTIGMA OU PRECONCEITO. DIREITO À REINTEGRAÇÃO - Res. 185/2012, DEJT divulgado em 25, 26 e 27.09.2012

Presume-se discriminatória a despedida de empregado portador do vírus HIV ou de outra doença grave que suscite estigma ou preconceito. Inválido o ato, o empregado tem direito à reintegração no emprego.”.

Em vista disso, no âmbito de um contrato de trabalho por prazo indeterminado, ainda que o empregado seja considerado apto para o trabalho no momento da rescisão contratual, caso fique demonstrado que a dispensa se deu tão somente por ele ser portador do vírus HIV ou de outra doença grave que suscite estigma ou preconceito é possível que a dispensa seja considerada inválida, caso em que, no âmbito de uma reclamatória trabalhista o trabalhador pode pleitear a reintegração ao trabalho, bem como, se for o caso, a condenação do empregador em danos morais. Nesse caso, caberia ao empregador se defender alegando que a dispensa se deu por outros motivos que não a doença, ou seja, motivos disciplinares, econômicos, entre outros.

Ademais, de acordo com o disposto no art. 443, § 2º, alínea “c”, da CLT, o contrato de experiência é um contrato a prazo determinado, que tem por finalidade dar mútuo conhecimento às partes contratantes, as quais, durante um período pré-fixado, analisam as condições em que a relação de emprego ocorre e sua intenção de dar ou não continuidade ao contrato. O art. 445, da CLT, deixa certo que a duração do contrato de experiência é de no máximo 90 dias.

Ainda, no decorrer do contrato de experiência, se presume o direito tanto do empregador, como do empregado, em extingui-lo pelo decurso de seu prazo. Assim, no término do referido contrato, caso uma das partes não pretenda dar continuidade ao contrato de trabalho, deverá, até a data da extinção, ou seja, até o último dia do término do contrato, efetuar a comunicação à outra parte da não intenção de continuidade do vínculo empregatício.

Com isso em mente, atualmente, prevalece o entendimento no âmbito da Justiça do Trabalho que a lei não impõe ao empregador a necessidade de justificar os motivos pelos quais não houve a manutenção da relação de emprego ao término do contrato de experiência, estando esse no exercício do seu poder potestativo.

Desse modo, mesmo que o empregado seja portador do vírus HIV ou de outra doença grave que suscite estigma ou preconceito ao término do contrato de experiência, em princípio, nada impede que o empregador dê o término no último dia do contrato de trabalho, restando afastada qualquer discussão acerca da dispensa discriminatória. Para corroborar com o exposto, segue abaixo uma decisão do Tribunal Superior do Trabalho – TST:

“AGRAVO DE INSTRUMENTO . CONTRATO DE EXPERIÊNCIA . COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS. NEOPLASIA MALIGNA DOS OVÁRIOS EM ESTÁGIO TERMINAL. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. PRESUNÇÃO. SÚMULA Nº 443 . PROVIMENTO. Por prudência, ante a possível contrariedade à Súmula nº 443 , o destrancamento do recurso de revista é medida que se impõe. Agravo de instrumento a que se dá provimento. RECURSO DE REVISTA . CONTRATO DE EXPERIÊNCIA . COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS. NEOPLASIA MALIGNA DOS OVÁRIOS EM ESTÁGIO TERMINAL. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. PRESUNÇÃO. SÚMULA Nº 443 . PROVIMENTO. Em que pese ser entendimento desta Corte Superior de que há presunção de ser discriminatória a dispensa do empregado portador de neoplasia maligna, na hipótese dos autos o término da relação jurídica se deu com o escoamento do prazo do contrato de experiência firmado. Cumpre ressaltar que a lei não impõe ao empregador a necessidade de justificar os motivos pelos quais não houve a manutenção da relação de emprego, estando esse no exercício do seu poder potestativo. Em tal hipótese, mostra-se cabível a realização do distinguishing , a fim de não se aplicar o entendimento consagrado na Súmula nº 443 . Dessa forma, o egrégio Tribunal Regional, ao deferir os danos morais por presunção da dispensa discriminatória, ainda que o término da relação jurídica tenha ocorrido com o exaurimento do prazo alusivo ao contrato de experiência, agiu em contrariedade à Súmula nº 443 . Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento.” (TST - RECURSO DE REVISTA: RR XXXXX20145120046).

Diante do exposto, atualmente, prevalece o entendimento no âmbito da Justiça do Trabalho de que a lei não impõe ao empregador a necessidade de justificar os motivos pelos quais não houve a manutenção da relação de emprego, estando esse no exercício do seu poder potestativo ao término do contrato por prazo determinado, como é o contrato de experiência.

Sendo assim, mesmo que o empregado seja portador do vírus HIV ou de outra doença grave que suscite estigma ou preconceito ao término do contrato de experiência, em princípio, mesmo ele estando incapaz ou não, em tratamento médico ou não, nada impede que o empregador dê o término no último dia do contrato de experiência, restando afastada qualquer discussão acerca da dispensa discriminatória, a qual, em princípio, aplica-se tão somente às dispensas sem justa nos contratos de trabalho por prazo indeterminado.

João Pedro de Sousa Porto Consultor da Área Trabalhista e Previdenciária