Artigo: Considerações sobre o pagamento em dinheiro do vale-transporte
Publicado em 30/11/2020 08:41Inicialmente, cumpre informar que, nos termos da Lei nº 7.418/1985, o vale-transporte constitui benefício que o empregador antecipa ao empregado para utilização efetiva em despesas de deslocamento residência-trabalho e vice-versa. No entanto, de acordo com a legislação, o benefício do vale-transporte não poderá ser pago em dinheiro, em regra geral, salvo na hipótese de falta ou insuficiência do estoque de VT necessário ao atendimento da demanda e ao funcionamento do sistema (de transportes), quando então o beneficiário será ressarcido pelo empregador da parcela correspondente na folha de pagamento imediata, caso tenha efetuado por conta própria a despesa para o respectivo deslocamento.
É importante destacar, ainda, que não existe na legislação trabalhista qualquer dispositivo referente à substituição do vale-transporte por qualquer outra forma de auxílio ao trabalhador, como auxílio-transporte ou, ainda, vale-combustível, por exemplo, muito comum no dia a dia de inúmeras empresas.
Entretanto, cumpre informar que o Ato Declaratório da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) nº 4/2016, com base na Súmula AGU nº 60/2011, estabelece que não há incidência de contribuição previdenciária sobre o vale-transporte pago em pecúnia, considerando o caráter indenizatório da verba.
Neste mesmo sentido é o posicionamento da RFB, em diversas Soluções de Consulta, que não incide contribuição previdenciária sobre os valores pagos em dinheiro a título de vale-transporte. No entanto, a não incidência está limitada ao valor pago em dinheiro estritamente necessário para o custeio do deslocamento residência-trabalho e vice-versa, em transporte coletivo. Neste norte, também é o posicionamento do TST, dispondo em diversas decisões judiciais quanto à natureza indenizatória do pagamento em dinheiro do vale-transporte.
Ainda, o art. 214, §9º, do Decreto n° 3048/1999, dispõe que não há incidência do INSS a parcela recebida a título de vale-transporte, ainda que paga em dinheiro, na forma da legislação própria.
Assim, seguem as seguintes Soluções de Consulta da Receita Federal do Brasil:
SOLUÇÃO DE CONSULTA Nº 313, DE 19 DE DEZEMBRO DE 2019
Assunto: Contribuições Sociais Previdenciárias
VALE-TRANSPORTE. VALE-COMBUSTÍVEL. NÃO INCIDÊNCIA.
Não incide contribuição previdenciária sobre os valores pagos a título de valetransporte por meio de vale-combustível ou semelhante. A não incidência da contribuição está limitada ao valor equivalente ao estritamente necessário para o custeio do deslocamento residência-trabalho e vice-versa, em transporte coletivo, conforme prevê o art.1º da Lei nº 7.418, de 16 de dezembro de 1985.
O empregador somente poderá suportar a parcela que exceder a seis por cento do salário básico do empregado. Caso deixe de descontar este percentual do salário do empregado, ou desconte percentual inferior, a diferença deverá ser considerada como salário indireto e sobre ela incidirá contribuição previdenciária e demais tributos.
SOLUÇÃO DE CONSULTA Nº 4.001, DE 21 DE JANEIRO DE 2020
Assunto: Contribuições Sociais Previdenciárias
Ementa: CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS PREVIDENCIÁRIAS. VALE-TRANSPORTE. INCIDÊNCIA .
Não incide contribuição previdenciária sobre os valores pagos a título de vale-transporte por meio de vale-combustível ou semelhante. A não incidência da contribuição está limitada ao valor equivalente ao estritamente necessário para o custeio do deslocamento residência / trabalho e vice-versa, em transporte coletivo, conforme prevê o art.1º da Lei nº 7.418, de 16 de dezembro de 1985. O empregador somente poderá suportar a parcela que exceder a seis por cento do salário básico do empregado. Caso deixe de descontar este percentual do salário do empregado, ou desconte percentual inferior, a diferença deverá ser considerada como salário indireto e sobre ela incidirá contribuição previdenciária e demais tributos.
Além disso, também neste mesmo sentido, foi publicada no DOU de 19.08.2020 a Solução de Consulta nº 4.021, de 17 de agosto de 2020, a qual esclarece que a contribuição previdenciária não incide sobre valores pagos a título de vale-transporte - independentemente se entregues em pecúnia ou não -, limitado à importância equivalente ao estritamente necessário para o custeio do deslocamento residência-trabalho e vice-versa, em transporte coletivo. No entanto, o empregador somente participará dos gastos de deslocamento do trabalhador com a ajuda de custo equivalente à parcela que exceder a 6% do salário básico deste. Nesse sentido, caso deixe de descontar esse percentual do salário do empregado, ou faça o desconto em percentual inferior, a diferença deve ser considerada como salário indireto e sobre ela incidirá a contribuição previdenciária. Desta forma, a parcela equivalente a 6% do salário básico ou vencimento do beneficiário, descontada pelo empregador, compõe o salário-de-contribuição e, portanto, não é dedutível da base de cálculo da contribuição previdenciária, conforme segue:
“SOLUÇÃO DE CONSULTA Nº 4.021, DE 17 DE AGOSTO DE 2020
Assunto: Contribuições Sociais Previdenciárias
Ementa: VALE-TRANSPORTE. NÃO INCIDÊNCIA. CONDICIONANTES. SALÁRIO-DECONTRIBUIÇÃO. SISTEMA DE COPARTICIPAÇÃO.
A contribuição previdenciária não incide sobre valores pagos a título de vale-transporte - independentemente se entregues em pecúnia ou não -, limitado à importância equivalente ao estritamente necessário para o custeio do deslocamento residência-trabalho e vice-versa, em transporte coletivo.
No entanto, o empregador somente participará dos gastos de deslocamento do trabalhador com a ajuda de custo equivalente à parcela que exceder a 6% (seis por cento) do salário básico deste. Caso deixe de descontar esse percentual do salário do empregado, ou faça o desconto em percentual inferior, a diferença deve ser considerada como salário indireto e sobre ela incidirá a contribuição previdenciária.
Desta forma, a parcela equivalente a 6% (seis por cento) do salário básico ou vencimento do beneficiário, descontada pelo empregador, compõe o salário-de-contribuição e, portanto, não é dedutível da base de cálculo da contribuição previdenciária.
VINCULAÇÃO ÀS SOLUÇÕES DE CONSULTA COSIT Nº 143, DE 27 DE SETEMBRO DE 2016; Nº 245, DE 20 DE AGOSTO DE 2019; Nº 313, DE 19 DE DEZEMBRO DE 2019, E Nº 58, DE 23 DE JUNHO DE 2020.
Dispositivos Legais: Lei nº 7.418, de 1985; Lei nº 8.212, de 1991, arts. 22, I, e 28, I, § 9º, "f"; Lei nº 10.522, de 2002, arts. 19 e 19-A; Decreto nº 95.247, de 1987; Decreto nº 3.048, de 1999, art. 214, § 9º, VI, e § 10, com redação do Decreto nº 10.410, de 2020; Instrução Normativa RFB nº 971, de 2009, art. 58, VI, com redação da Instrução Normativa RFB nº 1.867, de 2019; Súmula AGU nº 60, de 2011; Parecer PGFN/CRJ nº 189, de 2016; Ato Declaratório PGFN nº 4, de 2016;
Assunto: Normas Gerais de Direito Tributário
Ementa: DECISÕES DO Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF).
NÃO CARACTERIZAÇÃO COMO NORMA COMPLEMENTAR. EFEITOS "INTER PARTES".
As decisões proferidas pelo CARF não constituem normas complementares da legislação tributária, visto não possuírem caráter normativo ou vinculante, operando efeitos apenas "inter partes", e não "erga omnes". As decisões reiteradas e uniformes daquele colegiado são consubstanciadas em súmula de observância obrigatória pelos seus membros, podendo o Ministro de Estado da Economia atribuir-lhe efeito vinculativo em relação à Administração Tributária federal.
VINCULAÇÃO À SOLUÇÃO DE CONSULTA COSIT Nº 213, DE 3 DE MAIO DE 2017.
Dispositivos Legais: Lei nº 5.172, de 1966 (Código Tributário Nacional), art. 100, I e II; Portaria MF nº 343, de 2015 (Regimento Interno do CARF), Anexo II, arts. 72 e 75.
FLÁVIO OSÓRIO DE BARROS
Chefe”
Portanto, em que pese não haver previsão expressa na legislação, a princípio, pelo entendimento da RFB, nos moldes das Soluções de Consulta acima mencionadas, seria possível o pagamento em dinheiro do vale-transporte, no exato valor do benefício que o empregado teria direito, caso em que não integraria na remuneração do trabalhador, nem tampouco teria a incidência de contribuição previdenciária ou FGTS. Nesta situação, o empregador somente participará dos gastos de deslocamento do trabalhador com o valor equivalente à parcela que exceder a 6% do salário básico deste, sendo que, caso deixe de descontar o percentual de 6% do salário do empregado, ou faça o desconto em percentual inferior, a diferença deve ser considerada como salário indireto e sobre ela incidirá a contribuição previdenciária.
Graziela da Cruz Garcia
Consultora da Área Trabalhista e Previdenciária