Artigo: Conceito de Receita Bruta para fins de tributação

Publicado em 10/02/2020 11:34 | Atualizado em 23/10/2023 12:26
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Geralmente, conceituar um termo não é coisa tão impossível de se fazer. Contudo, quando se trata da terminologia “receita bruta”, para fins tributários, entramos em uma seara de conceitos.

 

Podemos dizer que receita bruta nada mais é que o produto da venda de bens e serviços, mas até que ponto podemos considerar este conceito para fins tributários. Será que na hora de apurar o Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ), a Contribuição Social sobre o Lucro (CSLL), as contribuições para o PIS/Pasep e para a Cofins podemos utilizar essa mesma definição?

 

Recentemente, tivemos a alteração do Decreto Lei nº 1.598/1977, em seu art. 12, por meio da Lei nº 12.973/2014, a qual determinou o seguinte:

 

Art. 12.  A receita bruta compreende:                     

I - o produto da venda de bens nas operações de conta própria;               

II - o preço da prestação de serviços em geral;            

III - o resultado auferido nas operações de conta alheia;

IV - as receitas da atividade ou objeto principal da pessoa jurídica não compreendidas nos incisos I a III.  

 

Este novo conceito de receita bruta vem trazendo diversos questionamentos sejam eles judiciais ou extrajudiciais, justamente pela inclusão deste inciso IV “as receitas da atividade ou objeto principal da pessoa jurídica não compreendida nos incisos I a III”.

 

Neste ínterim, o Fisco vem abrangendo no conceito de receita bruta, receitas que usualmente eram classificadas como receitas financeiras, entre elas os chamados juros pelo inadimplemento de vendas de bens ou serviços, alegando que tais receitas são oriundas do objeto social da empresa e, portanto, não deveriam ser classificadas como demais receitas ou como receitas financeiras.

 

Na atividade imobiliária, a inclusão de juros previstos em contratos já é questão pacificada e até expresso em legislação, mas a abrangência de tal posicionamento do fisco a demais atividades, poderia realmente ser motivo de questionamento, principalmente em relação à apuração de PIS/Pasep e Cofins, na qual as demais receitas e receitas financeiras não teriam a incidência das contribuições.

 

Vejamos o entendimento do fisco expresso na Solução de Consulta Cosit, abaixo, tratando de empresas que comercializam veículos:

 

Solução de Consulta Cosit nº 134, de 19 de setembro de 2018

Assunto: Contribuição para o PIS/Pasep

 

Ementa: Regime cumulativo. Base de Cálculo. Juros por inadimplemento. Variações Monetárias. Descontos condicionais obtidos

 

Cuidando-se de pessoa jurídica que se dedica ao comércio varejista de automóveis, no regime de apuração cumulativa da Contribuição para o PIS/Pasep:

 

  1. estão sujeitas à incidência da contribuição as receitas auferidas em razão da cobrança contra seus clientes de juros por atraso no adimplemento de obrigação;

 

  1. não se sujeitam à incidência da contribuição as receitas financeiras decorrentes de:

b.1) rendimentos de aplicações de disponibilidades financeiras em investimentos com rentabilidade fixa ou variável;

b.2) "variações monetárias dos direitos de crédito e das obrigações do contribuinte, em função da taxa de câmbio ou de índices ou coeficientes" (art. 9º da Lei nº 9.718, de 1998);

b.3) obtenção de descontos pela pessoa jurídica adquirente junto a seus fornecedores.

 

Dispositivos Legais: Lei nº 9.718/1998, arts. 2º, 3º e 9; Decreto-Lei nº 1.598/1977, art. 12; Decreto nº 3.000/1999, art. 373.

 

Nesse sentido, seguindo este entendimento do fisco, na prestação de serviço, na venda de mercadorias e na locação de bens moveis ou imóveis, quando houver a inadimplência do recebimento destas receitas e, por conseguinte, houver a incidência de juros, tais juros deverão ser levados a tributação do IRPJ e CSLL, bem como das contribuições para o PIS/Pasep e Cofins, independentemente do regime (cumulativo ou não cumulativo) uma vez que tais juros irão compor a receita bruta auferida.

 

Ainda, é oportuno lembrar que, no recurso judicial envolvendo pessoas jurídicas cujas atividades empresariais não se restringiam à venda de mercadorias e à prestação de serviços, o STF, reiteradamente (RE nº 371.258-AgR, Rel. Min. Cezar Peluso, Segunda Turma, DJ 27.10.2006; RE nº 318.160, DJ 17.11.2005, Rel. Min. Cezar Peluso; RE nº 367.482, DJ 28.11.2005, Rel. Min. Cezar Peluso; dentre outros) manifestou-se no sentido de que o conceito de receita bruta, sujeita tributação, envolve não só aquela decorrente da venda de mercadorias e da prestação de serviços, mas sim a soma das receitas oriundas do exercício das atividades empresariais.

 

Portanto, para que as empresas não venham a ser intimadas e posteriormente tenham problemas com recolhimento de tributos, aconselhamos que a receita bruta a ser considerada na base de cálculo do IRPJ, da CSLL, do PIS/Pasep e da Cofins seja tomada agregando os juros por inadimplemento, podendo, claro, cada contribuinte questionar o fisco sobre o assunto.

 

Andréa Giungi

Consultora da Área de Tributos Federais, Legislação Societária e Contabilidade