Artigo: Comentários sobre o descumprimento de normas constantes no documento coletivo

Publicado em 18/02/2019 09:39 | Atualizado em 20/10/2023 20:07
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Após a entrada em vigor da Lei n° 13.467/2017, em 11.11.2017, a chamada “Reforma Trabalhista”, muitas empresas levantaram questões sobre a necessidade ou não da observação da norma coletiva, seja acordo ou convenção coletiva. Entretanto, é importante observar que Reforma Trabalhista não alterou este ponto, ou seja, não isentou as empresa de observarem as disposições trazidas nos documentos coletivos.

 

Isto porque a própria Constituição Federal de 1988, em seu art. 7°, XXVI, elenca como um dos direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social, o reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho.

 

Ainda, de acordo com o artigo 611, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), a Convenção Coletiva de Trabalho é o acordo de caráter normativo pelo qual dois ou mais sindicatos representativos de categorias econômicas e profissionais estipulam condições de trabalho aplicáveis, no âmbito das respectivas representações, às relações individuais de trabalho.

 

Já o Acordo Coletivo de Trabalho, conforme disposição do § 1°, do mesmo artigo supracitado, é aquele celebrado entre o sindicato representativo de categorias profissionais e uma ou mais empresas da correspondente categoria econômica, que estipulem condições de trabalho, aplicáveis no âmbito da empresa ou das empresas acordantes às respectivas relações de trabalho.

 

Deste modo, as convenções e os acordos coletivos, uma vez realizados pela empresa ou sindicato, deverão ser observados, aplicando-se, portanto, as normas ali contidas.

 

Em relação à inobservância das regras contidas em convenções ou acordos coletivos, a própria CLT, em seu artigo 613, VIII, estabelece o seguinte:

 

“Art. 613 As Convenções e os Acordos deverão conter obrigatoriamente:

...

VIII – penalidades para os sindicatos convenentes, os empregados e as empresas em caso de violação de seus dispositivos.”

 

As penalidades mencionadas são, segundo o doutrinador Sergio Pinto Martins, cláusulas penais, sendo que o descumprimento da norma acarreta o pagamento da multa, que normalmente reverte em favor do empregado, pois quem a descumpre, na maioria das vezes, é o empregador (Comentários à CLT – 5ª Edição – Editora Atlas – pág. 316).

 

Importante salientar que a cláusula penal é uma espécie de pena pecuniária ou multa, prevista em contrato (ou em convenção/acordo coletivo de trabalho), no caso de inexecução completa da obrigação, de alguma cláusula especial ou simplesmente de mora, nos termos do art. 409, do Código Civil.

 

Assim, as penalidades referidas no art. 613, VIII, da CLT, são penalidades de natureza pecuniária, impostas para a parte que descumprir qualquer das obrigações constantes no documento coletivo. Essa penalidade poderá incidir mesmo que a cláusula descumprida seja mera repetição de texto legal, conforme entendimento do Tribunal Superior do Trabalho, consubstanciado na Súmula 384, item II.

 

Nesse contexto, temos também o art. 622, da CLT, o qual dispõe que, caso sejam celebrados contratos individuais de trabalho, estabelecendo condições contrárias ao que tiver sido ajustado em Convenção ou Acordo que lhes for aplicável, esses casos também serão passíveis de multa neles fixada.

 

Além disso, os acordos e convenções coletivas de trabalho são considerados pela doutrina e pela jurisprudência como fontes do Direito do Trabalho. Nesse sentido dispõe o ilustre juiz Sergio Pinto Martins:

 

“Outra fonte peculiar do Direito do Trabalho são as convenções e os acordos coletivos, que vêm exteriorizar a autonomia privada dos sindicatos nas negociações coletivas.

[...]

Assim, as regras que forem estabelecidas em convenções e acordos coletivos serão de observância nas categorias respectivas, sendo, portanto, uma das fontes de Direito do Trabalho.” (Direito do Trabalho – 29ª Edição – Editora Atlas)

 

Sendo fonte do Direito do Trabalho, portanto, as convenções e acordos coletivos são de observância obrigatória pelas partes que os firmaram. Deste modo, e conforme ensina o art. 8°, da CLT, as autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por equidade e outros princípios e normas gerais do direito, principalmente do direito do trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado.

 

Ademais, é importante lembrar também que, nos termos do art. 611-B, da CLT, o qual foi incluído pela Reforma Trabalhista, os direitos ali elencados constituem objeto ilícito de convenção coletiva ou de acordo coletivo de trabalho, exclusivamente, a sua supressão ou redução. Desta forma, não é possível que haja a disposição em norma coletiva, dos direitos previstos no citado artigo.

 

Portanto, diante de todo o exposto, mesmo após a Reforma Trabalhista, a empresa deve observar as normas coletivas normalmente e, caso não cumpra com as obrigações previstas em acordos ou convenções coletivas, além das penalidades supramencionadas, poderá sofrer reclamatórias trabalhistas na Justiça do Trabalho, de empregados que se sintam prejudicados moral ou patrimonialmente, ou até mesmo ações por parte do Ministério Público do Trabalho, na defesa dos interesses coletivos desses empregados e da sociedade como um todo.

 

Nesse sentido, segue o seguinte julgado:

 

EMENTA: Regime de compensação de jornada. Horas extras. Embora a compensação praticada tenha previsão na norma coletiva e no acordo individual, houve desrespeito aos próprios termos da convenção coletiva, que exige autorização médica para as empregadas menores. Dessa forma, inválida a compensação praticada, sendo devidos os adicionais nos termos da Súmula nº 85 do TST. Contagem minuto a minuto. A posição majoritária da 3ª Turma é pela aplicação do art. 58, 1º, da CLT, que autoriza a desconsideração dos 5 minutos que antecedem e sucedem a jornada de trabalho. (...) (TRT-4 - RO: 631200779104000 RS 00631-2007-791-04-00-0, Relator: FRANCISCO ROSSAL DE ARAÚJO, Data de Julgamento: 01/04/2009, Vara do Trabalho de Encantado)

 

Graziela Garcia

Consultora da Área Trabalhista e Previdenciária