Artigo: Caracterização da justa causa e a jurisprudência dos tribunais trabalhistas
Publicado em 18/06/2019 08:21 | Atualizado em 20/10/2023 20:34De início, lembramos que as hipóteses legais previstas para aplicação de punições ao empregado, bem como para que seja efetuada a rescisão de contrato de trabalho por justa causa, estão elencadas no art. 482, da CLT.
A justa causa é todo o ato faltoso grave praticado pelo empregado que autoriza o empregador a rescindir o seu contrato de trabalho, que tem por amparo o fato de que a conduta praticada pelo trabalhador retira da esfera do contrato de trabalho seu principal elemento, que é a confiança imprescindível ao relacionamento entre as partes.
Além disso, para que a justa causa seja válida, o empregador tem de observar os seguintes requisitos:
- imediatidade: não pode haver o transcurso de um longo tempo entre o conhecimento da falta pelo empregador e a aplicação da penalidade, sob pena de configurar perdão tácito. Assim, logo que o empregador tomar conhecimento da prática do ato faltoso, deve providenciar a aplicação da penalidade;
- proporcionalidade entre a falta e a punição: a justa causa deve ser aplicada para falta gravíssima, aquela que impede o prosseguimento da relação de emprego em razão da quebra de confiança; e
- vedação da dupla punição (non bis in idem): o empregador não pode punir o empregado duas vezes pela mesma falta.
Como o empregador tem o comando da empresa e também da relação de emprego, à luz do disposto no art. 2º, da CLT, cabe ao mesmo, caso o empregado venha a cometer qualquer falta ou delito, o direito de punir o trabalhador, com advertências, suspensões e justa causa, devendo observar, ainda, para a efetiva caracterização desta última, os princípios e elementos previstos no Direito do Trabalho (gravidade, atualidade e imediatidade entre a falta e a rescisão).
No entanto, há situações em que não se exige a gradação de sanções se a gravidade do ato justifica a sumária dispensa por justa causa. Neste sentido, recentemente, o Colendo Tribunal Superior do Trabalho validou uma rescisão por justa causa em virtude da apresentação de atestado médico falso pelo trabalhador (Processo: E-RR-132200-79.2008.5.15.0120).
Na Subseção, o relator, ministro Walmir Oliveira da Costa, ressaltou que o servente foi suspenso por ter apresentado atestado médico falso. No decorrer da suspensão, o empregado apresentou outro atestado adulterado, o que resultou na dispensa por justa causa. Para o ministro, o empregado cometeu ato de improbidade, artigo 482, alínea "a”, CLT. “A prática desse delito não é suscetível de ensejar, tão somente, a pena de advertência”, possibilitando a despedida em razão de falta grave, afirmou.
Segundo o tribunal, o princípio da proporcionalidade entre a falta e a punição, embora discipline hipóteses em que o empregador exorbite seu poder disciplinar, não tem aplicação irrestrita, pois encontra limites no direito assegurado em lei ao empregador para rescindir o contrato de trabalho, por justa causa, quando o empregado cometer falta grave prevista no art. 482, da CLT, agindo com menoscabo do dever de confiança recíproca, ou seja, violando o elemento fiduciário que alicerça o vínculo empregatício, conforme se verificou na hipótese dos autos.
Corrobora com esse entendimento, o seguinte julgado:
(...) JUSTA CAUSA. INQUÉRITO PARA APURAÇÃO DE FALTA GRAVE. NÃO COMPROVAÇÃO. 1 - O recurso de revista foi interposto na vigência da Lei n° 13.015/2014 e atende aos requisitos do art. 896, § 1º-A, da CLT. 2 - A demissão por justa causa, punição máxima, somente se justifica quando a gravidade da conduta do trabalhador ou a inequívoca quebra de confiança sejam de tal ordem que inviabilizem a gradação de sanções. 3 - As premissas fáticas registradas no acórdão recorrido demonstram, de maneira inequívoca, que a reclamada não comprovou os motivos que constituíram a justa causa do reclamante por ato de improbidade e incontinência de conduta ou mau procedimento, e deve ser mantida a decisão que não reconheceu a justa causa aplicada ao reclamante. 4 - Nesses aspectos, para se chegar à conclusão diversa da exposta pelo Tribunal Regional, forçoso será o reexame de fatos e provas, o que é vedado nesta instância extraordinária, ao teor da Súmula n° 126 desta Corte. Ileso, portanto, o art. 482, a e b, da CLT. 5 - Agravo de instrumento a que se nega provimento. (...) (AIRR - 10097-76.2015.5.18.0141 , Relatora Ministra: Kátia Magalhães Arruda, Data de Julgamento: 10/05/2017, 6ª Turma, Data de Publicação: DEJT 12/05/2017)
Diante do exposto acima, insta consignar que a dispensa por justa causa é modalidade de extinção contratual por infração obreira apta a quebrar a fidúcia necessária para a continuidade do vínculo de emprego. Portanto, para a sua caracterização, devem estar presentes os seguintes requisitos: a) tipicidade da conduta; b) autoria obreira da infração; c) dolo ou culpa do infrator; d) nexo de causalidade; e) adequação e proporcionalidade; f) imediaticidade da punição; g) ausência de perdão tácito; h) singularidade da punição ("non bis in idem"); i) caráter pedagógico do exercício do poder disciplinar, com a correspondente gradação de penalidades. Contudo, em situações excepcionais, é possível se inferir que a jurisprudência do C.TST sinaliza não ser exigível a gradação de sanções, quando a gravidade do ato praticado justifica a sumária dispensa por justa causa.
Érica Nakamura
Consultora da Área Trabalhista e Previdenciária