Artigo – A dispensa por justa causa do empregado que perde a habilitação ou os requisitos estabelecidos em lei para o exercício da profissão

Publicado em 16/11/2021 10:10 | Atualizado em 23/10/2023 13:29
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O não cumprimento das obrigações contratuais por parte do empregado autoriza o empregador a aplicar penalidades ao empregado faltoso, como advertência, suspensão e, até mesmo, dispensa por justa causa, caso o ato faltoso seja grave ou praticado de forma reiterada.

 

A justa causa tem previsão no art. 482, da CLT, sendo caracterizada pela dispensa provocada pelo empregado ao cometer ato ilícito violador de suas obrigações legais ou contratuais para com o empregador. Essa violação torna impossível a permanência do empregado na empresa e faz com que o empregador não tenha mais condições de manter o vínculo contratual, o que o leva a aplicar a pena máxima, que é o rompimento do contrato de trabalho por justo motivo. A dispensa do empregado por justa causa é a pena máxima a ser aplicada a todo ato gravíssimo praticado pelo empregado, bem como nas hipóteses de reiteração de atos considerados mais leves.

 

Nessa toada, a Reforma Trabalhista, trazida pela Lei n° 13.467/2017, incluiu no art. 482, da CLT, a alínea “m”, como uma hipótese para dispensa por justa causa a perda da habilitação ou dos requisitos estabelecidos em Lei para o exercício da profissão, em decorrência de conduta dolosa do empregado.

 

Assim, se mostra possível a dispensa por justa causa de um trabalhador que perde a habilitação ou um dos requisitos em Lei para o exercício da sua profissão, desde que isso se dê em face de uma conduta dolosa do empregado.

 

Podemos citar, por exemplo, o caso dos empregados motoristas profissionais, que devem possuir a respectiva Carteira Nacional de Habilitação na categoria necessária para desempenharem as suas funções, bem como os empregados vigilantes, que devem observar os requisitos definidos pela Lei nº 7.102/1983 para o exercício da sua profissão.

 

Ainda, considera-se dolo a vontade de produzir o resultado, bem como aquele que mesmo prevendo o seu resultado assume o risco de produzi-lo.

 

Segundo Maurício Godinho Delgado, Ministro do Tribunal Superior do Trabalho, em seu livro Curso de Direito do Trabalho, 18ª edição: “É o que se passa, por exemplo, com a perda da habilitação para a prática da Medicina. E, de certa maneira, com a perda da habilitação para o exercício da profissão de Motorista. Naturalmente que, em se tratando de justa causa, torna-se fundamental a análise concreta dos três grupos de elementos convergentes para a aplicação da pena máxima ao empregado: os elementos classificados como subjetivos, objetivos e circunstanciais. Nesse quadro, deve-se tomar em conta, por exemplo, as circunstâncias que envolvem o surgimento do óbice para o exercício do mister profissional. No caso do Motorista, ilustrativamente, é decisivo saber se se trata de simples impedimento temporário, passível de singela e rápida superação, ou se se trata de óbice de longa duração, com superação mais árdua e complexa.”.

 

Desta feita, para que o empregador possa aplicar a dispensa por justa causa lastreada na hipótese acima mencionada, é preciso que tenha a efetiva comprovação de que a perda da habilitação ou de um dos requisitos para o exercício da profissão tenha se dado de forma consciente pelo trabalhador, ou seja, quando esse produziu deliberadamente o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo. Para corroborar o exposto, segue o julgado abaixo:

 

"RECURSO ORDINÁRIO. JUSTA CAUSA. FALTA GRAVE COMETIDA POR MOTORISTA PROFISSIONAL. INFRAÇÃO DE TRÂNSITO. DIREÇÃO SOB INFLUÊNCIA DE ÁLCOOL. SUSPENSÃO DO DIREITO DE DIRIGIR NO CURSO DO CONTRATO DE TRABALHO. APLICAÇÃO DA ALÍNEA m DO ARTIGO 482 DA CLT. Ao alterar o artigo 482 da CLT, incluindo no referido artigo a alínea m, vê-se que a Lei 13.467/2017 introduziu nova modalidade de extinção do contrato de trabalho por justa causa do empregado. A referida modalidade de justa causa, que atinge todas as atividades, profissões e funções que exijam qualquer sorte de habilitação ou requisitos legais específicos para o seu respectivo exercício, necessita da combinação cumulativa da perda da habilitação técnica para o exercício da profissão regulamentada com a falta intencional do empregado na perda da habilitação ou dos requisitos ou, ainda, assumido o risco de produzir o resultado danoso (dolo eventual). No caso, o reclamante, contratado pelo Município reclamado para o exercício da função de motorista profissional, foi flagrado por agente policial dirigindo seu veículo particular, fora do expediente, sob a influência de álcool acima do permissivo legal, o que culminou na imposição de penalidade de suspensão do direito de dirigir por 12 (doze) meses, nos termos do artigo 16 da Resolução 182/2005 do CONTRAN. Desta forma, ao assumir o risco de dirigir sob efeito de álcool além dos limites legais, com a suspensão da CNH, requisito indispensável para o exercício das atividades de motorista profissional, por certo que tal infração refletiu de forma grave o desempenho de suas atividades laborais na reclamada, validando a justa causa nos termos do artigo 482, alínea m da CLT.” (TRT-15 - ROT: 00111648120195150024 0011164-81.2019.5.15.0024, Relator: FABIO ALLEGRETTI COOPER, 6ª Câmara, Data de Publicação: 23/06/2021).

 

Outrossim, salientamos que no Direito do Trabalho vigora o princípio da continuidade da relação de emprego, logo, se o empregador alegar o cometimento de uma justa causa pelo empregado, em uma ação trabalhista, o ônus de prova quanto ao ato faltoso é do empregador, nos termos do art. 818, da CLT, art. 373, do CPC/2015, e Súmula n° 212, do TST.

 

Portanto, o art. 482, alínea “m”, da CLT, inserido pela Lei nº 13.467/2017 (Reforma Trabalhista), trouxe a hipótese de dispensa por justa causa no caso do empregado que perde a habilitação ou um dos requisitos estabelecidos em Lei para o exercício da profissão em decorrência de conduta dolosa. Nessa situação, a empresa deve ter a efetiva comprovação de que a perda da habilitação ou um dos requisitos se deu por conduta dolosa do empregado, ou seja, que ele teve a vontade deliberada ou assumiu o risco de produzir a situação causadora da perda, sob pena de reversão da justa causa em eventual reclamatória trabalhista.

 

João Pedro de Sousa Porto

Consultor da Área Trabalhista e Previdenciária