Artigo: A dispensa por justa causa do empregado que apresenta atestado médico falso ou rasurado e a desnecessidade do boletim de ocorrência
Publicado em 31/10/2022 14:33Os atestados médicos têm por fim justificar e/ou abonar as faltas do empregado ao serviço em decorrência de incapacidade para o trabalho motivada por doença ou acidente de trabalho. Assim, de acordo com o art. 131, inciso III, da CLT, não será considerada falta ao serviço a ausência do empregado por motivo de doença ou acidente de trabalho.
Com isso, o atestado médico, desde que preenchidos seus requisitos legais, justifica as faltas, assim como as demais previstas na legislação trabalhista brasileira, como as inseridas no art. 473, da CLT.
Contudo, a apresentação de atestado médico falso pode ensejar uma dispensa por justa causa.
Nessa toada, as hipóteses legais previstas para aplicação de punições ao empregado, bem como que seja efetuada a rescisão de contrato de trabalho por justa causa, estão elencadas no art. 482, da CLT.
Justa causa é todo o ato faltoso grave praticado pelo empregado que autoriza o empregador a rescindir o seu contrato de trabalho, que tem por amparo o fato de que a conduta praticada pelo trabalhador retira da esfera do contrato de trabalho seu principal elemento, que é a confiança imprescindível ao relacionamento entre as partes.
Como o empregador tem o comando da empresa e também da relação de emprego, cabe ao mesmo, caso o empregado venha a cometer qualquer falta ou delito, o direito de punir o trabalhador, com advertências, suspensões e justa causa, devendo observar, ainda, para a efetiva caracterização desta última, os princípios e elementos previstos no Direito do Trabalho (gravidade, atualidade e imediatidade entre a falta e a rescisão).
Entretanto, há determinados atos que, quando cometidos pelo empregado, asseguram o direito de o empregador automaticamente rescindir o contrato de trabalho por justa causa, sem a observância de aplicação de penalidades gradativas convencionais, como advertências escritas ou suspensões disciplinares, pois o fato, por si só, por se considerar grave, enseja a ruptura contratual, como nos casos de furto, roubo, atos de improbidade, entre outros elencados no art. 482, da CLT.
A improbidade significa a falta de honradez do empregado no modo de se conduzir na vida. Trata-se de procedimento do empregado contrário às regras morais ou jurídicas que disciplinam a vida em sociedade. Seu fundamento é no sentido de transgressão das regras da lei e da moral.
Todos os atos praticados pelo empregado que revelem, inequivocamente, desonestidade, abuso, fraude ou má-fé são caracterizados como improbidade, em razão do estado de foro íntimo e pessoal de que essa se reveste.
Caracteriza-se como improbidade a falsificação ou adulteração de atestado médico, entre outros. Nesse sentido, segue o julgado abaixo:
“RECURSO ORDINÁRIO DO RECLAMANTE. ATESTADO MÉDICO FALSO. JUSTA CAUSA. A ruptura do contrato de trabalho por justa causa deve ser cabalmente demonstrada, exigindo-se prova inequívoca da falta atribuída ao empregado. A apresentação de atestado médico falso, além de crime, caracteriza sem dúvida alguma hipótese que justifica a resilição do pacto laboral caracterizada por mau procedimento nos termos do artigo 482, 'b', da Norma Consolidada.” (TRT-1 - RO: 00022296220125010226 RJ, Relator: Marcelo Augusto Souto de Oliveira. Data de Julgamento: 03/06/2014, Quinta Turma, Data de Publicação: 09/06/2014).
Em tal situação, se o empregador aplicar uma penalidade ao empregado, em uma ação trabalhista, o ônus de prova quanto ao ato faltoso é do empregador, nos termos do art. 818, da CLT, art. 373, do CPC/2015, e Súmula n° 212, do TST. Desse modo, é importante que o empregador tenha a efetiva comprovação de que o atestado médico é falso ou que foi rasurado, o que pode ser constatado pelo médico ou pela clínica que emitiu o documento.
No mais, a lavratura de um boletim de ocorrência não é um requisito necessário à aplicação de penalidades ao empregado, tal como a dispensa por justa causa, tendo em vista que essa é uma notícia crime direcionada às autoridades policiais para a persecução do fato no âmbito penal.
Portanto, cometendo o empregado um ato faltoso durante a prestação de seus serviços, bem como não cumprindo as suas obrigações contratuais, é possível que o empregador, através do seu poder disciplinar, nos termos do art. 2°, da CLT, lhe aplique penalidades disciplinares, como advertência, suspensão ou até mesmo uma justa causa. Em tal situação, a apresentação de atestado falso ou rasurado pode ensejar a penalidade máxima ao empregado, ou seja, a dispensa por justa causa, sendo que o ideal é que o empregador possua a efetiva comprovação de que o documento foi falsificado.
Ainda, a lavratura de um boletim de ocorrência não é um requisito necessário à aplicação de penalidades ao empregado, tal como a dispensa por justa causa. Na prática, a depender do caso, ele pode ser um documento utilizado pelo empregador para fundamentar a aplicação da penalidade, contudo, como já mencionado, não é obrigatório, ou seja, tem o condão de auxiliar a persecução penal do fato. Posto isso, no âmbito trabalhista, exige-se tão somente o relatório emitido pelo médico, o qual comprova a falsificação do atestado, para fundamentar a dispensa por justa causa, ou seja, a lavratura do B.O fica a critério do empregador, caso queira ver a responsabilização do trabalhador na seara criminal, o qual pode responder pelo crime de falsificação de documento.
João Pedro de Sousa Porto
Consultor da Área Trabalhista e Previdenciária