Opinião - Questões trabalhistas afetam as exportações
Área: Pessoal Publicado em 15/12/2022 | Atualizado em 23/10/2023
Fonte: Folha de São Paulo
Torna-se cada vez mais relevante que empresas exportadoras adotem sistemas de due diligence e de gerenciamento de riscos para que suas mercadorias não sejam afetadas
As exportações brasileiras podem ser significativamente afetadas em um futuro próximo, nos Estados Unidos e na União Europeia (UE), por evidências de violações a direitos humanos e trabalhistas.
Estima-se que milhões de pessoas estejam trabalhando em condições abusivas em todo o mundo. Segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), existem 160 milhões de trabalhadores infantis e 27,6 milhões de trabalhadores forçados.
Torna-se cada vez mais relevante que exportadores adotem sistemas de due diligence e de gerenciamento de riscos
Recentemente, o Department of Labor (DOL) dos Estados Unidos publicou a 10ª edição da “Lista de Bens Produzidos por Trabalho Infantil ou Trabalho Forçado”, na qual identificou indústrias estrangeiras que supostamente possuem envolvimento com trabalho infantil e forçado.
O DOL rastreou cadeias de fornecimento globais complexas com o intuito de identificar produtos finais e intermediários que, em algum momento, tiveram envolvimento com trabalho forçado ou infantil.
O DOL também publicou a 21ª edição do relatório “Descobertas sobre as Piores Formas de Trabalho Infantil”, no qual analisa 131 países e territórios com situações de trabalho infantil. Nesse relatório, foi descrito o progresso de alguns países para manter seus compromissos internacionais de eliminar essas práticas, bem como recomendações específicas para eliminação do trabalho infantil.
Com o intuito de eliminar o trabalho infantil e forçado em todo o mundo, o DOL desenvolveu portais e aplicativos que contêm informações sobre bens produzidos com trabalho infantil ou trabalho forçado e as últimas informações sobre os esforços dos governos para lidar com esse assunto, por produto e país, além de proporcionar às empresas orientações detalhadas sobre como desenvolver sistemas de conformidade social em suas cadeias de fornecimento globais e evitar abusos de condições trabalhistas.
No continente europeu, também há uma grande preocupação em banir o trabalho forçado que impactará significativamente os exportadores, incluindo empresas brasileiras. A Comissão Europeia propôs uma nova regulamentação que proíbe o ingresso de produtos fabricados com trabalho forçado no mercado da União Europeia, que ainda não foi aprovada pelo Parlamento Europeu e pelo Conselho da União Europeia.
De acordo com a regulamentação proposta, as autoridades nacionais nos Estados membros da UE avaliariam se há razões bem fundamentadas para suspeitar que determinados produtos comercializados foram produzidos com trabalho forçado.
Caso identificassem uma preocupação fundamentada, iniciariam investigações e solicitariam informações às empresas, além de realizar verificações e inspeções nas fábricas. Se as autoridades não pudessem reunir todas as provas que requerem (por exemplo, devido à falta de cooperação por parte de uma empresa ou de uma autoridade estatal não pertencente à UE), elas poderiam tomar uma decisão com base nos fatos disponíveis. Caso as autoridades europeias concluíssem que determinado produto teve envolvimento com trabalho forçado, deveriam proibir imediatamente a colocação e disponibilização desse produto no mercado da UE, além de exigir a retirada desses produtos do mercado, seu descarte ou destruição.
O regulamento proposto também prevê a criação de um banco de dados e da plataforma denominada “Rede de Produtos de Trabalho Forçado da UE”, criada para assegurar a coordenação e cooperação estruturadas entre as autoridades competentes e a Comissão.
Estados Unidos e União Europeia estão desenvolvendo regras próprias sobre esses temas em razão da ausência de regras comerciais multilaterais claras sobre “padrões trabalhistas” que incluem a forma como os trabalhadores são tratados, o uso de trabalho infantil e trabalho forçado, até o direito de organizar sindicatos e greve, salários mínimos, condições de saúde e segurança e horário de trabalho.
Há algumas décadas, os membros da Organização Mundial do Comércio (OMC) tentam chegar a um consenso sobre a criação de regras básicas sobre questões trabalhistas essenciais, como a proibição da importação de mercadorias que sejam produzidas com trabalho forçado, trabalho infantil e em condições de trabalho discriminatórias.
As medidas adotadas por Estados Unidos sobre trabalho forçado e infantil já estão afetando o ingresso de exportações brasileiras de diversos produtos no país. O mesmo deverá ocorrer na União Europeia após a entrada em vigor das normas que estão em fase de aprovação. Tais medidas criam barreiras não tarifárias às importações, com vistas a proteger valores considerados importantes para a sociedade.
É importante que quaisquer medidas restritivas que venham a ser adotadas por determinado governo, seja em razão de trabalho infantil e trabalho forçado, seja com qualquer outro fundamento, sejam devidamente justificada e estabelecidas em conformidade com as regras e princípios da OMC, tais como tratamento nacional e não discriminação.
A incerteza em torno da compatibilidade entre as regras da OMC e os direitos humanos e trabalhistas tem atraído atenção crescente e gerado apelos para a reforma da Organização. Enquanto as regras multilaterais não são criadas, e considerando um cenário de aumento nas restrições às exportações em razão das condições de trabalho, torna-se cada vez mais relevante que empresas exportadoras adotem sistemas de due diligence e de gerenciamento de riscos para que suas mercadorias não sejam afetadas e, consequentemente, que possam continuar ingressando em outros mercados.
Fernanda Manzano Sayeg é sócia no escritório Borges Furlaneto & Sayeg Advogados - BFSA Trade Law
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Torna-se cada vez mais relevante que empresas exportadoras adotem sistemas de due diligence e de gerenciamento de riscos para que suas mercadorias não sejam afetadas
As exportações brasileiras podem ser significativamente afetadas em um futuro próximo, nos Estados Unidos e na União Europeia (UE), por evidências de violações a direitos humanos e trabalhistas.
Estima-se que milhões de pessoas estejam trabalhando em condições abusivas em todo o mundo. Segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), existem 160 milhões de trabalhadores infantis e 27,6 milhões de trabalhadores forçados.
Torna-se cada vez mais relevante que exportadores adotem sistemas de due diligence e de gerenciamento de riscos
Recentemente, o Department of Labor (DOL) dos Estados Unidos publicou a 10ª edição da “Lista de Bens Produzidos por Trabalho Infantil ou Trabalho Forçado”, na qual identificou indústrias estrangeiras que supostamente possuem envolvimento com trabalho infantil e forçado.
O DOL rastreou cadeias de fornecimento globais complexas com o intuito de identificar produtos finais e intermediários que, em algum momento, tiveram envolvimento com trabalho forçado ou infantil.
O DOL também publicou a 21ª edição do relatório “Descobertas sobre as Piores Formas de Trabalho Infantil”, no qual analisa 131 países e territórios com situações de trabalho infantil. Nesse relatório, foi descrito o progresso de alguns países para manter seus compromissos internacionais de eliminar essas práticas, bem como recomendações específicas para eliminação do trabalho infantil.
Com o intuito de eliminar o trabalho infantil e forçado em todo o mundo, o DOL desenvolveu portais e aplicativos que contêm informações sobre bens produzidos com trabalho infantil ou trabalho forçado e as últimas informações sobre os esforços dos governos para lidar com esse assunto, por produto e país, além de proporcionar às empresas orientações detalhadas sobre como desenvolver sistemas de conformidade social em suas cadeias de fornecimento globais e evitar abusos de condições trabalhistas.
No continente europeu, também há uma grande preocupação em banir o trabalho forçado que impactará significativamente os exportadores, incluindo empresas brasileiras. A Comissão Europeia propôs uma nova regulamentação que proíbe o ingresso de produtos fabricados com trabalho forçado no mercado da União Europeia, que ainda não foi aprovada pelo Parlamento Europeu e pelo Conselho da União Europeia.
De acordo com a regulamentação proposta, as autoridades nacionais nos Estados membros da UE avaliariam se há razões bem fundamentadas para suspeitar que determinados produtos comercializados foram produzidos com trabalho forçado.
Caso identificassem uma preocupação fundamentada, iniciariam investigações e solicitariam informações às empresas, além de realizar verificações e inspeções nas fábricas. Se as autoridades não pudessem reunir todas as provas que requerem (por exemplo, devido à falta de cooperação por parte de uma empresa ou de uma autoridade estatal não pertencente à UE), elas poderiam tomar uma decisão com base nos fatos disponíveis. Caso as autoridades europeias concluíssem que determinado produto teve envolvimento com trabalho forçado, deveriam proibir imediatamente a colocação e disponibilização desse produto no mercado da UE, além de exigir a retirada desses produtos do mercado, seu descarte ou destruição.
O regulamento proposto também prevê a criação de um banco de dados e da plataforma denominada “Rede de Produtos de Trabalho Forçado da UE”, criada para assegurar a coordenação e cooperação estruturadas entre as autoridades competentes e a Comissão.
Estados Unidos e União Europeia estão desenvolvendo regras próprias sobre esses temas em razão da ausência de regras comerciais multilaterais claras sobre “padrões trabalhistas” que incluem a forma como os trabalhadores são tratados, o uso de trabalho infantil e trabalho forçado, até o direito de organizar sindicatos e greve, salários mínimos, condições de saúde e segurança e horário de trabalho.
Há algumas décadas, os membros da Organização Mundial do Comércio (OMC) tentam chegar a um consenso sobre a criação de regras básicas sobre questões trabalhistas essenciais, como a proibição da importação de mercadorias que sejam produzidas com trabalho forçado, trabalho infantil e em condições de trabalho discriminatórias.
As medidas adotadas por Estados Unidos sobre trabalho forçado e infantil já estão afetando o ingresso de exportações brasileiras de diversos produtos no país. O mesmo deverá ocorrer na União Europeia após a entrada em vigor das normas que estão em fase de aprovação. Tais medidas criam barreiras não tarifárias às importações, com vistas a proteger valores considerados importantes para a sociedade.
É importante que quaisquer medidas restritivas que venham a ser adotadas por determinado governo, seja em razão de trabalho infantil e trabalho forçado, seja com qualquer outro fundamento, sejam devidamente justificada e estabelecidas em conformidade com as regras e princípios da OMC, tais como tratamento nacional e não discriminação.
A incerteza em torno da compatibilidade entre as regras da OMC e os direitos humanos e trabalhistas tem atraído atenção crescente e gerado apelos para a reforma da Organização. Enquanto as regras multilaterais não são criadas, e considerando um cenário de aumento nas restrições às exportações em razão das condições de trabalho, torna-se cada vez mais relevante que empresas exportadoras adotem sistemas de due diligence e de gerenciamento de riscos para que suas mercadorias não sejam afetadas e, consequentemente, que possam continuar ingressando em outros mercados.
Fernanda Manzano Sayeg é sócia no escritório Borges Furlaneto & Sayeg Advogados - BFSA Trade Law
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