Notícia - Trabalhadora obrigada a frequentar culto evangélico será indenizada

Área: Pessoal Publicado em 19/09/2022 | Atualizado em 23/10/2023 Imagem coluna Foto: Divulgação
Fonte: Jornal Valor Econômico

Enfermeira espírita era coagida pela superior hierárquica a participar do rito de outra religião

Uma enfermeira que era obrigada a frequentar cultos evangélicos no horário de trabalho deve receber R$ 10 mil de indenização por danos morais em razão da violação ao direito de liberdade religiosa. O Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo (TRT-SP) foi unânime ao condenar o seu antigo empregador, o Centro de Estudos e Pesquisas Dr João Amorim (Cejam) — uma entidade privada que presta serviços de saúde pública para diversas prefeituras. Não cabe mais recurso.

Segundo o processo, a enfermeira era coagida pela superior hierárquica a participar de cultos evangélicos no início do expediente, sendo que era espírita.

Situações como essa, que tratam de intolerância religiosa no ambiente de trabalho têm aumentado no Brasil e no mundo, segundo o advogado Marcelo Martins, sócio do Granadeiro Guimarães advogados, que assessorou à enfermeira. Segundo ele, outros países como a França e Chile também têm passado por situações semelhantes.

A decisão, contudo, reforça que o Brasil é um Estado laico, de acordo com a Constituição Federal, e deve haver liberdade religiosa. “Ninguém deve impor sua religião à outra pessoa”, diz.

A liberdade religiosa está prevista nos inciso VI do artigo 5º da Constituição. O dispositivo diz que “ é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias”.

A enfermeira alegou no processo que era coagida a frequentar os cultos. Começou a sofrer perseguições da superiora hierárquica, que chegava a gritar com ela a chamando de incompetente, invadia sua sala de atendimento e a usava como exemplo negativo para os demais da equipe em reuniões.

A enfermeira, segundo o advogado, chegou a pedir transferência para outra unidade. Mas teve seu pedido recusado, até que foi demitida. Foi então que entrou com processo na Justiça do Trabalho. Em primeira instância, o pedido de indenização foi negado, mas a funcionária recorreu ao TRT que reformou a decisão.

Ao analisar o caso, a 4ª Turma do TRT de São Paulo entendeu que as provas testemunhais comprovam a exigência para participação em orações evangélicas.

Segundo a decisão da relatora, desembargadora Ivani Contini Bramante, essa postura “claramente, ofende seu direito à liberdade religiosa, na forma do artigo 5º, inciso VI, da Constituição Federal, bem como o tratamento com rigor excessivo e a exposição da Reclamante à outros empregados, o que extrapola, e muito, o poder diretivo da empregadora” (ROT nº 1000410-31.2021.5.02.0711).

Procurada pelo Valor, a assessoria de imprensa do Cejam informou por nota que cumprirá a decisão. Ainda disse que “a instituição tem trabalhado incansavelmente para coibir e prevenir qualquer prática de assédio, dentro das melhores práticas de governança em conformidade com o ambiente regulatório”. Ainda acrescentou que “a instituição sempre prezou pela diversidade em seu corpo de colaboradores, atuando firmemente no combate a atitudes discriminatórias.”
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