Notícia - A reforma tributária e os benefícios trabalhistas
Área: Pessoal Publicado em 30/05/2025Fonte: Jornal Valor Econômico
Caso as empresas não possuam acordos ou convenções coletivas de negociação com entidades representativas de seus funcionários, não poderão apropriar créditos de IBS e CBS sobre a concessão de benefícios trabalhistas.
Os benefícios trabalhistas são vantagens que as empregadoras podem oferecer aos seus colaboradores, como uma maneira de proporcionar melhores condições de trabalho, além dos salários pagos. Significa dizer que podem e devem ser vistos como uma maneira de melhorar a vida dos colaboradores e, ao mesmo tempo, agregar na reputação e imagem da empresa, pois acrescentam qualidades e facilidades à vida daqueles com quem mantêm vínculos de trabalho e emprego.
A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) estabelece uma lista de benefícios que são obrigatórios e todas as organizações devem oferecer. Porém, há uma gama de outras alternativas e opções que podem ser adotadas, a depender da sua cultura organizacional e valores de cada empresa. É o caso daqueles que são concedidos por liberalidade das companhias, justamente como uma forma de implementar melhores condições de trabalho e de aderência aos seus valores e princípios.
Dentre os direitos obrigatórios, estão os depósitos do FGTS, as férias remuneradas com adicional de 1/3, o 13º salário, o adicional de horas extras e o adicional noturno. Já alguns não obrigatórios comumente concedidos são o vale-alimentação e o vale-refeição, a assistência médica, o plano odontológico e o auxílio-educação.
Embora se trate de prática e sistemática já bem estabelecida e compreendida pelo mercado de trabalho, esse cenário será enormemente impactado pela reforma tributária, pois a forma com que tais benefícios passam a ser previstos e concedidos terá diferentes reflexos tributários para as empresas concedentes
Num primeiro momento, pode causar certa estranheza cogitar que uma reforma tributária impacte em relações trabalhistas, mas as novidades da Emenda Constitucional nº (EC) 132/23 e regulamentadas pela Lei Complementar (LC) nº 214/24 trazem significativas mudanças na sistemática de tomada de créditos tributários das empresas, o que envolve o pagamento de benefícios trabalhistas.
No sistema tributário nacional, existem tributos não cumulativos, que são aqueles que operam por uma lógica de créditos e débitos. Assim, ao mesmo tempo que a venda de uma mercadoria, a saída de um produto industrializado ou a obtenção de receita ensejam débitos tributários de ICMS, IPI e PIS/Cofins, respectivamente, temos também que, por exemplo, a compra de insumos gera créditos para fins de abatimento de tais tributos.
Logo, tributos não cumulativos, normalmente vinculados a tributos incidentes sobre comercialização de produtos, mercadorias e serviços, adotam uma lógica de créditos e débitos, segundo a qual existem débitos sobre operações de saída que gerem receita e créditos sobre operações de entrada de itens relacionados à atividade operacional das empresas.
Com isso em mente e em relação à reforma tributária, interessa atentar para a sistemática de tomada de créditos dos novos tributos não cumulativos por ela criados: o IBS e a CBS. A regra geral estabelece que haverá direito ao crédito de IBS e CBS sempre que houver pagamento desses tributos na etapa anterior, ou seja, sobre os gastos incorridos pelas empresas contribuintes.
Eis então a grande questão: os benefícios trabalhistas pagos pelas empresas permitirão a tomada de créditos? A LC 214/25, em seu artigo 57, II, parágrafo 3º, IV, dispõe que determinados benefícios trabalhistas pagos pelas empresas somente gerarão créditos de IBS e de CBS se forem concedidos por força de acordo ou convenção coletiva. Entre eles estão: plano de saúde, vale-transporte, vale-refeição e vale-alimentação e benefícios educacionais (como bolsas de estudo e descontos em mensalidades).
Tem-se, portanto, que a dinâmica de remunerações, concessões de benefícios e negociações coletivas do trabalho é diretamente impactada pela reforma tributária, pois a forma com que tais benefícios estarão previstos e o fundamento de sua concessão passam a ter impactos financeiros para os respectivos empregadores.
Não se trata apenas de dimensionar o impacto dos benefícios em si, mas também sobre a forma como são concedidos, ou seja, se fundamentados em acordo ou convenção coletiva do trabalho ou não. Embora não se saiba com certeza a alíquota do IBS e CBS, estima-se que orbitará na casa dos 27,5%, o que significa dizer que enquadrar os benefícios trabalhistas como creditáveis ou não passa a ter um impacto financeiro e concorrencial tremendo para todas as empresas.
Com efeito, não se trata apenas de competitividade em condições de contratação de funcionários, mas também em competitividade financeira na gestão da composição dos vínculos empregatícios, pois a tomada de créditos de IBS e CBS sobre os gastos com benefícios trabalhistas possibilitará às empresas o abatimento dos respectivos valores dos seus tributos.
Logo, a questão perpassa por um nível estratégico de readequação das estruturas de vínculos empregatícios das empresas e na forma de interlocução com seus funcionários, pois se faz necessária uma adaptação estratégica a respeito de como tais benefícios são concebidos e concedidos.
Caso as empresas não possuam acordos ou convenções coletivas de negociação com entidades representativas de seus funcionários, terão que enfrentar maiores custos para a concessão de benefícios trabalhistas, pois não poderão apropriar créditos de IBS e CBS sobre tais desembolsos. Isso incentivará tanto empresas quanto empregados a tais âmbitos de negociação, pois ao mesmo tempo que haverá um impacto concorrencial entre os custos de tais desembolsos dentre empresas, também é verdade que é do interesse dos funcionários a concessão e manutenção de tais benefícios.