ITCMD e doações de bens no exterior
Área: Fiscal Publicado em 04/02/2025ITCMD e doações de bens no exterior
Em março de 2021, o Supremo Tribunal Federal (STF) firmou tese de repercussão geral pela qual os Estados e o Distrito Federal não podem instituir a cobrança do imposto de doação e causa mortis (ITCMD), sobre bens situados no exterior. O recurso extraordinário que serviu de base para que a tese de repercussão geral fosse fixada é emblemático, pois envolveu a herança que uma advogada recebeu do pai, residente da Itália, sendo os bens originários daquele país (RE 851108/SP, Rel. Min. Dias Toffoli).
A tese de repercussão geral do Tema 825 assentou que é vedado aos Estados e Distrito Federal instituir o ITCMD nas hipóteses referidas no art. 155, § 1°, III, da Constituição Federal, sem a edição da lei complementar exigida pelo referido dispositivo constitucional. Segundo o decidido pelo STF, a lei complementar federal é indispensável para a exigência do ITCMD, quando houver elemento relevante de conexão com o exterior, uma vez que cabe a mencionada lei complementar estabelecer os elementos de conexão necessários para a incidência do tributo e definir para qual unidade federada o imposto será devido.
Sem a edição da lei complementar federal, os Estados podem exercer a competência legislativa apenas no contexto de operações e bens situados no país. Com isso, leis estaduais que instituam o ITCMD sobre bens situados fora do país são inconstitucionais. Além do mais, em 2022, o STF estabeleceu prazo de 12 meses para o Congresso editar lei complementar que regulamentasse o ITCMD, a fim de possibilitar a exigência do tributo, quando houvesse conexão com o exterior (STF, ADO 67/DF, Rel. Min. Dias Toffoli).
A Reforma Tributária manteve a exigência de lei complementar federal, para regulamentar a cobrança do ITCMD relacionado a bens com conexão com o exterior. No entanto, em seu art. 16, estabeleceu regras provisórias de competência, enquanto referida lei complementar federal não for aprovada. Segundo essas regras, se o doador tiver domicílio ou residência no exterior, o ITCMD caberá ao Estado onde tiver domicílio o donatário ou ao Distrito Federal. Se o donatário tiver domicílio ou residir no exterior, o imposto caberá ao Estado em que se encontrar o bem ou ao Distrito Federal. E, do mesmo modo, relativamente aos bens de falecido, ainda que situados no exterior, o imposto caberá ao Estado onde era domiciliado, ou, se domiciliado ou residente no exterior, onde tiver domicílio o sucessor ou legatário, ou ao Distrito Federal.
Nesse contexto, a controvérsia ressurge, para definir se nas operações realizadas com bens no exterior, após a vigência da Reforma Tributária, já é possível a cobrança do ITCMD. Ora bem, a Reforma Tributária apenas instituiu os parâmetros para definição da competência entre os Estados. Cabe, portanto, aos Estados-membros, por meio de legislação estadual, instituir o referido tributo, quando houver conexão com ato ou bens situados no exterior. E nem há como advogar que a legislação estadual anterior seria suficiente para tal cobrança, uma vez que o STF as considerou inconstitucionais, em conformidade com a decisão do Tema de Repercussão Geral 825.
A situação tem sido refletida em decisões do TJSP, as quais destacam a falta de norma válida que ampare a cobrança do tributo (TJSP, respectivamente, 5ª e 11ª Câmara de Direito Público, AI 3007261-28.2024.8.26.0000 e Ap. 1028192-24.2024.8.26.0053, Rel. Des. Francisco Bianco e Ricardo Dip), bem como em atos administrativos de Minas Gerais e Rio de Janeiro, que somente admitem a exigência do ITCMD, nessas hipóteses de conexão com o exterior, quando se trata de imóvel situado no Estado.
Em síntese, há três situações possíveis: (i) doação sobre bens imóveis situados país – o ITCMD caberá ao Estado em que situado tais bens, antes ou após Reforma Tributária, mesmo que o doador resida no exterior; (ii) doação sobre bens móveis situados no exterior (como participações de uma empresa), antes da vigência da Reforma Tributária – não há como incidir ITCMD, conforme decisão do STF no Tema 825; e (iii) no caso de doação de bens móveis situados no exterior, após a vigência da Reforma Tributária – a questão é controversa, mas a melhor posição é que a aprovação de normas estaduais, após a Reforma Tributária, é necessária para que o tributo possa ser exigido.
Fonte: Tribuna do Norte